À medida que se sobe a Mata do Jamor, barulho. Vários instrumentos, dos quais se destaca claramente um tambor, e um som que vai ficando cada vez mais nítido e vai ecoando por entre as árvores: «Mafraaaaa!»

Ora pois, era a festa mafrense no Jamor antes da tão desejada final do Campeonato de Portugal, frente ao Farense, e que terminou da melhor maneira para os cerca de 3 mil adeptos que fizeram a viagem de cerca de 50 quilómetros desde Mafra até ao estádio mais icónico do país.

João Rolo faz parte desse grupo de adeptos. Camisola do Mafra vestida, copo na mão, o jovem de 24 anos aceita sem hesitar uma conversa com o Maisfutebol e revela, orgulhoso, que é neto de um ex-presidente do clube.

«Não sou sócio do Mafra, mas sou adepto, sou de Mafra, sempre fui de Mafra, o meu avô, Herlander Rolo, foi presidente do clube, e costumo acompanhar a equipa, embora agora nem tanto porque a minha vida não me permite», começa por contar.

A vitória, essa, espera que seja a da sua equipa, que se veio mesmo a confirmar, mas para o jovem, importa destacar a moldura humana: «Espero ganhar, não é fácil, o Farense é uma boa equipa, também traz aqui uns excelentes adeptos, mas Mafra é Mafra. Temos aqui uma excelente moldura humana, muito muito boa, e tudo malta de Mafra», salienta.

«A festa está bonita, temos ali porco no espeto, sangria, cerveja, vinho, aguardente, tudo o que é preciso para se fazer uma boa festa», acrescenta de forma bastante descontraída.

A partida era decisiva, mas a subida à II Liga já havia sido garantida há duas semanas, frente à União de Leiria. Por isso mesmo, os festejos estavam sempre garantidos, independentemente do resultado: «A festa está garantida. Hoje [domingo] estamos a celebrar a subida do Mafra e não a vitória do Mafra. A única coisa que queremos é que o Mafra faça uma excelente exibição e nós vamos aplaudi-la sempre.»

Num tom mais sério, João Rolo antecipa a temporada que aí vem, deixando alguns conselhos para que o clube consiga estabilizar-se nos escalões profissionais.

«Na próxima época devemos pensar mais num projeto de três anos de permanência e depois, sim, pensar numa subida. Isso é mais importante do que propriamente querermos meter um bocadinho «a carroça à frente dos bois», passar do Campeonato de Portugal para a II Liga é completamente diferente, acho que devíamos começar por baixo, a querer manter, a querer segurar alguns valores que temos no plantel e se calhar alimentá-lo com novos reforços, mas com calma, o Mafra é um clube grande e vai crescer muito.», diz.

A moldura humana dos adeptos do Mafra nas bancadas do Jamor

«Toda a gente está à espera que a gente perca»

Guilherme Fernandes acaba de subir ao meeting-point dos adeptos mafrenses na Mata do Jamor. Bem-disposto, o adepto de 70 anos acredita na sua equipa, mas aproveita para dar uma bicada ao favoritismo do adversário.

«Espero que o Mafra ganhe, pois claro. Toda a gente está à espera que a gente perca. Porquê? Porque está tudo feito para o Farense, basta ver como fomos empurrados cá para cima», começa por dizer, visivelmente desagradado com os vários degraus que teve de ultrapassar.

«Já fizemos a festa, em Mafra, quando garantimos a subida à II Liga, e agora se ganharmos a festa será a dobrar, se não ganharmos, festejamos na mesma porque somos desportistas», afirma.

Para a próxima temporada, Guilherme Fernandes pede mais condições para que a equipa consiga a permanência no segundo escalão do futebol português: «Na próxima época espero que não desçamos como da outra vez (risos). Acho que tem de haver mais investimento, em jogadores, nas condições, acho que ainda faltam algumas [condições] para o Mafra se manter na segunda. Terá de haver um grande esforço da parte dos responsáveis, porque se não descemos outra vez ao Campeonato de Portugal.»

O espírito do Algarve no Jamor

Para os cerca de sete mil adeptos do Farense que se deslocaram do Algarve até ao Estádio do Jamor a festa começou com cheiro intenso a churrasco, muita música e várias garrafas de cerveja já acumuladas nos vários caixotes do lixo. Entre eles, Albertino Madeira. 74 primaveras concluídas, 45 delas como sócio do clube algarvio, é apresentado pelos amigos como o «número 1 de Faro». Homem de poucas palavras, faz questão de frisar que esteve presente na final e na finalíssima da Taça de Portugal de 1990, então vencida pelo Estrela da Amadora ao seu clube do coração.

«O que é que espero? Que o meu Farense ganhe. Se a gente não ganhar a festa não está estragada, mas a gente ganha. 2-0», começa por garantir ao Maisfutebol, e longe ainda de imaginar que a tarde não ia correr de feição para os homens de Faro.

«A final do Jamor é um dia diferente, veio muita gente, quarenta autocarros, e vamos levar a Taça para baixo. A força do Farense são os adeptos», acrescenta.

Albertino é então questionado sobre o que é que essa força tem de tão de especial em relação aos outros clubes. Faltam-lhe as palavras, e prefere «passar a bola» a outro amigo: «Ó João, anda cá!»

Cerca de sete mil adeptos do Farense estiveram presentes nas bancadas do Jamor

O sangue dos farenses, diferente dos outros

João Teixeira era também um adepto confiante. «O pessoal de Faro vem todo entusiasmado para levar daqui uma vitória, mesmo que chova, uma vitória molhada», começa por dizer.

O entusiasmo, esse, justifica-se pela boa época da equipa de Rui Duarte, mas não só: «O que justifica este entusiasmo são os resultados que o Farense fez ao longo da época no campeonato nacional e o entusiasmo que as pessoas têm relativamente ao regresso do clube aos campeonatos profissionais. O pessoal está todo entusiasmado, faz lembrar há uns anos em que o Farense veio à final da Taça de Portugal com o Estrela da Amadora e trouxe a cidade de Faro em peso, e hoje volta a acontecer o mesmo.»

«O espírito do Algarve nestas situações está todo unido. Portimonense e Olhanense? O Farense é a única equipa que consegue movimentar uma massa associativa assim. Este acompanhamento ao clube está no sangue dos farenses», acrescenta, antes de revelar que «largou» o seu cartão de sócio por alguns tempos: «Fui sócio 25 anos, depois desisti e agora voltei novamente. Sou o sócio três mil, mas há trinta anos era o sócio mil e cem, hoje se calhar estava nos dez primeiros.»

Sobre a próxima época, na II Liga, João Teixeira espera uma abordagem cautelosa: «Espero que o Farense faça um campeonato tranquilo, que não entre em loucuras e que fique no meio da tabela. Grão a grão é que a galinha enche o papo. Não é subir de divisão agora e pensar já na I Liga. Temos de fazer um campeonato tranquilo, organizado, com uma boa equipa, para não andar sempre a sofrer até à última e é isso que desejo.»