*Com Pedro Jorge da Cunha e Bruno José Ferreira

O duelo entre o Nacional da Madeira e o FC Porto vai proporcionar um reencontro de velhos conhecidos. Foi o próprio Nuno Espírito Santo a dar o mote na conferência de imprensa de antevisão do jogo: «Conheço bem Manuel Machado. Já o defrontei muitas vezes e foi, inclusive, meu treinador.»

Ora, o percurso de ambos tem o Vitória de Guimarães como traço comum mais óbvio. Machado foi treinador de Nuno Espírito Santo nos juniores vimaranenses. Mas há mais. Treinou-o, também, no SC Vila Real, na época 1993/94 e, ainda antes disso…deu-lhe a primeira oportunidade na Liga.

Como?!

Precisamente. Esta não é uma questão simples e exigiu, até, o cruzamento de várias fontes. Em Guimarães, por exemplo, a ideia que vigora é a de que Nuno só se estreou na Liga a 17 de novembro de 1994, num jogo caseiro com o Gil Vicente, era Quinito o treinador. Entrou ao minuto 17 a substituir o lesionado Madureira. Aliás, as crónicas dos jornais da altura, como mostra esta imagem do «Desportivo de Guimarães», falam em três estreias (presumimos que na temporada) naquele encontro: Madureira, Ziad e Nuno.

A 'segunda estreia' de Nuno, no jornal «Desportivo de Guimarães»

Esta foi a versão que nos foi contada várias vezes. Em Guimarães, mas também por Armando, colega de Nuno nos juniores, ou Pedro Barbosa. Todos com uma garantia: não há certezas absolutas, mas a ideia é que só com Quinito Nuno teria feito primeiro jogo pela equipa sénior do Vitória. «Há até aquela frase do Quinito que diz ao Nuno: miúdo, põe lá o gel que vais jogar hoje», recorda Pedro Barbosa.

Porém, outros registos apontavam mais para trás, o que motivou mais pesquisa. A estreia do atual técnico portista não teria sido nesse jogo da Liga 1994/95, mas à última jornada da Liga 1992/93, ainda com idade de júnior.

Curiosamente, o adversário foi também o Gil Vicente, mas em Barcelos. Os da casa ganharam 2-0, com bis de Drulovic. E quem estava no banco vitoriano? Manuel Machado, nem mais, nem menos.

Esta é a parte mais curiosa da história, pois, nesse ano, Manuel Machado era, como se disse, treinador dos juniores, enquanto a equipa principal estava entregue a Bernardino Pedroto que substituíra Marinho Peres a meio da época, face aos maus resultados.

A verdade, contudo, é que foi Manuel Machado a ir para o banco em Barcelos. O próprio treinador do Nacional, rival portista este sábado, numa curta conversa com o Maisfutebol confirmou essa história.

«O Pedroto teve de ausentar-se para observar um jogador que até viria a ser importante no futebol português: o Zahovic. Como o jogo era na última jornada e não tinha influência na classificação tomou-se essa decisão», explicou.

De qualquer forma, Manuel Machado salienta: «Sinceramente, não tenho memória de ter lançado o Nuno. É possível dadas as características do jogo. Mas não faz muito sentido dizer que fui eu que lancei o Nuno. Eu estava no banco, sim, mas a decisão estava tomada. E só depois com o Quinito teve continuidade.»

A análise do técnico insular faz todo o sentido, claro, mas a verdade dos factos é uma: quando Nuno fez o primeiro jogo na Liga, quem estava no banco era mesmo Manuel Machado. As dúvidas foram dissipadas com uma consulta ao arquivo do «Diário de Notícias». 

A estreia de Nuno no «Diário de Notícias», a 6 de junho de 1993

«Machado gostava muito dele; foi sempre titular»

A ligação entre os dois é, portanto, desde o berço. Quase literalmente. Conheceram-se em Guimarães, quando Manuel Machado treinava a equipa de juniores. «Era um homem da casa que várias vezes assegurava a equipa em períodos de transição dos treinadores, mas era, essencialmente, o responsável pelos juniores», conta Armando, antigo avançado que se destacou com a camisola do Moreirense. Também ele fazia parte daquela equipa.

«Fui colega do Nuno algum tempo. Eu era mais velho um ano, portanto quando o conheci ele era júnior de primeiro ano e eu já era de segundo. Já se notavam as potencialidades que haveriam de fazer dele o guarda-redes que depois foi», continua o atual treinador do Esporões, a AF Braga.

Estávamos na época 1992/93. Nuno destacava-se nos juniores e já era, até, visto como o terceiro guarda-redes vimaranense, atrás de Madureira e Jesus. A foto do plantel, abaixo, prova isso mesmo. No ano seguinte, com 19 anos, a opção foi empresta-lo para jogar mais. Seguiu, então, para o SC Vila Real da antiga II Divisão B. O treinador era…Manuel Machado.

O plantel 1992/93 do V. Guimarães com Nuno (ao centro na fila de cima) e Manuel Machado (ao centro, fila de baixo). Foto: Glórias do Passado

Também Armando fez o mesmo caminho. «O Vitória estabeleceu uma parceria com o Vila Real para cedência de jogadores. Fui eu e o Nuno e pudemos continuar a ser treinados pelo Manuel Machado», recorda.

Era a primeira experiência do, agora, treinador do Nacional, numa equipa sénior, no papel de técnico principal. Tinha 38 anos. «Eu trabalhei muitos anos com ele e a linha foi sempre muito idêntica. Futebol de processos simples. Em Vila Real mostrou logo ser um líder nato. Fizemos um bom campeonato», lembra Armando.

A relação com Nuno, que tinha ido para Vila Real por indicação de Machado, era ótima: «Gostava muito dele. Era fácil gostar porque ele tinha qualidade, também. Foi logo titular e a prova é que no ano seguinte voltou a Guimarães para ficar na primeira equipa.»

O resto, como se diz, é história. Este sábado, os caminhos, cruzados naquela tarde de Barcelos há quase 25 anos, reencontram-se.