Budomir Vujacic, antigo defesa do Sporting, é agora presidente da assembleia geral da Federação Jugoslava de Futebol. Budo, que alinhou quatro anos em Portugal, reside no Montenegro mas esteve em Belgrado para rever amigos do Sporting, embora acabasse por não assistir ao jogo com o Partizan, devido a um vírus que o deixou com febre. Para o esquerdino, os problemas no futebol jugoslavo são apenas um reflexo (entre muitos) da crise que afectou o país.

«As coisas mudaram muito nos últimos dez anos. Num país com guerras, bombardeado pela NATO, e em crise económica, o futebol deixou de ser fundamental na vida das pessoas. A importância passou a ser secundária e tudo resulta daí. O futebol é um reflexo da sociedade. Se há guerra e as condições económicas e sociais não são favoráveis, não há moral no futebol.»

O campeonato perdeu a força, a selecção também, mas depois de bater no fundo, Vujacic acredita que as coisas estão a melhorar. «Durante a guerra na Bósnia e na Croácia e durante os bombardeamentos da NATO à Sérvia não havia campeonatos, os problemas eram muitos e a maior parte dos jogadores saiu do país. Houve muitas complicações com Slobodan Milosevic, mas as coisas agora vão andar para a frente.»

O optimismo

Vujacic é um dos mais optimistas com quem o Maisfutebol falou. Para o antigo jogador do Sporting, a entrada de novas pessoas na federação é um primeiro sinal de mudança fundamental. No entanto, o grande impulso, diz o antigo jogador, seguindo o seu raciocínio, resultará da melhoria das condições do país. «A situação económica, se tudo correr bem, vai melhorar dentro de um ou dois anos e os clubes vão poder pagar salários mais elevados. Se calhar seria possível não deixar Kezman ir para o PSV só porque ia ganhar o dobro. Até esta época faltou regularidade no Campeonato jugoslavo, mas a competição está mais forte, já se sente um pouco o facto de a situação do país estar a melhorar.»

O facto de Estrela Vermelha e Partizan terem seguido em frente na Taça UEFA, deixando para trás Chievo Verona e Sporting, é mais um sinal, defende. «Com bons resultados na Europa e grandes jogos o público vai voltar aos estádios. O número de espectadores está a crescer, o que não pode separar-se do facto de os melhores jogadores terem ficado no país.» Este ano os dois grandes jugoslavos não venderam ninguém, o que «mostra que quando se guarda uma equipa, uma geração junta, não é por acaso que se ganha».

«O Sartid teve o estádio quase cheio contra o Ipswich, se tivesse havido público o estádio do Partizan também teria enchido contra o Sporting. Na pré-eliminatória da Liga dos Campeões o Partizan fez um óptimo jogo frente ao Bayern Munique, apesar de ter perdido, e o Sartid também passou a pré-eliminatória da Taça UEFA. Sente-se no futebol jugoslavo mais regularidade, a qualidade dos árbitros também está a subir.»

De qualquer forma, concorda Vujacic, será preciso tempo para a nova Jugoslávia poder voltar a ser uma potência do futebol europeu, como era no início dos anos 90. «Já não há a velha Jugoslávia com equipas de classe da Croácia, da Eslovénia, da Macedónia ou da Bósnia e as competições internas, em todos estes países, perderam valor. Todos os países do mundo têm gerações melhores e outras menos boas e a nossa será muito difícil de substituir, porque foi uma das melhores de sempre, mesmo da antiga Jugoslávia. Esperamos muito da nova geração, há jovens com muito valor no Estrela Vermelha, no Partizan, no Sartid, no Vojvodina Novi Sad, e o futuro vai ser melhor, mas precisamos de tempo, nada se muda tão rápido.»

A mágoa

Na selecção as mudanças também são lentas e os problemas resultantes de anos de guerra e crise fazem com que ainda se olhe para os antigos craques como a solução imediata. «Há um fosso entre a geração de que fiz parte, e em que os jogadores que ainda jogam só o farão mais ou um dois anos, e a seguinte. O facto de essa geração estar agora a ocupar cargos de importância, com Dragan Stojkovic como presidente da federação ou Dejan Savicevic como treinador, é muito bom, porque são jovens mas já com muitos anos de futebol. Mijatovic voltou a jogar, o que é muito importante. Não interessa se o faz no Valência ou no Levante, a sua experiência e o seu comando são fundamentais.»

Neste misto de experiência e de «jovens jogadores que não são muito conhecidos mas são muito bons», Vujacic acredita na qualificação para o Europeu de 2004, que decorrerá em Portugal. «A Itália é favorita no grupo, mas já perdeu com a Eslovénia e nós não estamos piores que a Eslovénia. Perdemos com a República Checa num amigável por 5-0, mas foi importante, porque havia jogadores no ar. Com luta e sacrifício poderemos sair de cabeça levantada, mesmo que não consigamos apurarmo-nos.»

A qualificação seria mais um bom sintoma de recuperação do futebol e a oportunidade de os actuais responsáveis vingarem uma situação de que Vujacic ainda fala com mágoa: «Empurraram-nos para fora do Europeu da Suécia, em 92, por causa do embargo. Tivemos um grande azar. Fomos a primeira selecção a qualificar-se, e depois fomos substituídos pela Dinamarca que venceu o Campeonato. Ficámos fora por causa de problemas políticos, coisa com que não posso concordar. O desporto foi penalizado, mas não é culpado por discordâncias políticas. Era uma grande geração que vai ser difícil repetir.»

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