Na década de 90, Kazu Miura tornou-se na primeira grande superestrela do futebol japonês. Duas décadas após o auge da carreira, aos 49 anos, o avançado mantém o estatuto de lenda no seu país, mas ainda não pensa em aposentar-se, a ponto de esta semana ter renovado contrato por um ano com o Yokohama FC, da J-League 2 (segundo escalão), clube que representa desde 2005.

«Espero continuar a lutar ao lado dos meus colegas de equipa e dos adeptos, que sempre me têm apoiado», disse numa declaração singela Miura no momento da renovação, que foi saudada por vários colegas de profissão, até por Iker Casillas.

«Eu queria jogar até aos 40 anos, mas pelo que leio… Até aos 50! Grande Miura!», escreveu na sua conta oficial do Twitter o guarda-redes espanhol do FC Porto.

Miura é uma espécie de último samurai do futebol japonês. Avesso à reforma e com uma longevidade nos campos correspondente à do país com maior esperança média de vida em todo o mundo, o mítico «camisola 11» jogará para lá dos 50 anos, mas nem sequer precisa de ultrapassar a barreira do meio século de vida para ser já considerado o mais velho futebolista profissional em atividade.

Os golos da carreira de Miura:

É um exemplo de longevidade comparável ao do inglês Stanley Matthews, que na década de 60 pendurou as chuteiras aos 50 anos como jogador do Stoke City. Mais recentemente, outros dois ingleses destacaram-se pela longevidade ao atuarem em clubes dos escalões inferiores do futebol inglês: o defesa internacional Stuart Pearce jogou com 53 anos pelo Longford e o guarda-redes Dave Beasant fez parte do plantel do Stevenage até aos 54 anos. Nenhum dos casos é comparável com o patamar em que está neste momento o avançado japonês.  

Japonês com samba no pé

A vida de Kazuyioshi parece uma saga digna da popular série de anime Oliver e Benji, que ao longo das últimas décadas tem feito fãs um pouco por todo o mundo.

Aos 15 anos, emigrou para o Brasil com o objetivo de ser profissional: completou a formação na Juventus, clube da comunidade italiana de São Paulo, e já como sénior chegou a representar o Palmeiras e o Santos. Tudo isto antes de regressar ao Japão para jogar pelo Verdy Kawazaki (1991 a 1998), hoje Tokyo Verdy, a tempo de ser a grande estrela local no arranque da J-League, criada em 1993.

Miura ao serviço do Sydney, no Mundial de Clubes no Japão, em 2005

Neste período, dois interregnos para jogar no futebol europeu: em 1994/95 vestiu a camisola do Génova (22 jogos, 1 golo), tornando-se no primeiro jogador japonês a jogar na Liga Italiana e em 1999 foi campeão na Liga Croata pelo Dínamo de Zagreb. Depois, novo regresso ao Japão, com uma curta passagem por empréstimo pelo Sydney FC em 2005, tendo jogado o Mundial de Clubes no Japão pela equipa australiana antes de passar em definitivo a representar o Yokohama FC.

E entre todas estas aventuras, mais uma, inusitada, quando em 2012, então com 45 anos, fez parte da seleção japonesa de futsal, que disputou o Campeonato do Mundo, na Tailândia, tendo inclusivamente defrontado Portugal na fase de grupos (empate 5-5, o Japão foi eliminado no grupo pela Seleção Nacional por diferença de golos).

Miura em ação frente à Ucrânia no Mundial de Futsal de 2012

Desengane-se, pois, quem pensar que o avançado 89 vezes internacional pelo Japão (55 golos) tem feito nos tempos recentes apenas figura de corpo presente nos jogos da sua equipa ou que a sua continuidade nos relvados é apenas um golpe de marketing.

No ano de 2016, Miura, que vai para a 32.ª temporada da sua carreira, participou em 20 jogos da sua equipa e fez dois golos. Aliás, em 2016, numa vitória por 3-2 sobre o Cerezo Osaka, revalidou o seu próprio recorde como jogador mais velho do mundo a marcar num jogo oficial.

Marcou e celebrou com uma troca de pés que se tornou ao longo dos anos numa espécie de imagem de marca. Apesar da idade respeitável, King Kazu não abdica de comemorar com o seu passinho de samba, tal como quando era um adolescente que emigrou para o Brasil com o sonho de ser futebolista. Fazer golos é um excelente pretexto para a continuar a dançar.