Feliz coincidência, esta: dois portugueses conseguem feitos inéditos no desporto internacional num dia em que o futebol está parado, um facto que permite fazer incidir toda a luz em João Sousa e Rui Costa.

Logo de manhã, João Sousa ganhou o primeiro torneio ATP e esta segunda-feira deverá entrar na lista dos melhores 50 tenistas da atualidade.

Depois do almoço, Rui Costa desiludiu dois espanhóis e tornou-se campeão do mundo de fundo, ele que tem aproveitado os últimos meses para fazer nome no ciclismo.

Um tem 24 anos, o outro fará 27 nos primeiros dias de outubro. Nasceram ambos no norte do país e têm em comum um outro facto: precisaram de emigrar para crescer.

Ao contrário do que sucede em outros países, a escassa cultura desportiva dos portugueses deixa pouco espaço para tudo o que não seja o futebol de Benfica, FC Porto e Sporting.

Sem espaço nos media não existem patrocinadores. E sem patrocinadores não é possível fazer carreira por cá.

Uma parte deste diagnóstico é válido para outras atividades e tem a ver com a dimensão do país, para mais em tempos de crise.

Os feitos individuais de João Sousa e Rui Costa não são, pois, sinal de que alguma coisa está para mudar no desporto português. Resultam da aposta de ambos (e de mais alguns), do risco que correm e do trabalho que fazem. Lá fora.

NOTA: Trabalhei em «A Bola» entre 1992 e 2000. Este foi o período que muita coisa mudou. Os jornais desportivos passaram a diários. Os custos subiram, a pressão sobre a venda também. O espaço dedicado aos clubes grandes multiplicou-se por quatro. A dependência multiplicou-se por dez, vinte. O mais infeliz dos dirigentes de clube «grande» tornou-se pelo menos tão «famoso» como qualquer campeão, de qualquer modalidade. João Sousa e Rui Costa não fazem vender jornais. E nunca farão. É tarde de mais para mudar.