Lourosa: onde 4.500 adeptos vão a um jogo dos Distritais

CAMINHOS DE PORTUGAL é uma nova rubrica do jornal Maisfutebol que visita o dia-a-dia de determinado clube dos escalões não profissionais. Tantas vezes na sombra, este futebol em estado puro merecerá cada vez mais a nossa atenção. Percorra connosco estes CAMINHOS DE PORTUGAL.

LUSITÂNIA DE LOUROSA, 1ª DIVISÃO DA A.F. AVEIRO

Se a Liga está bipolarizada, à conta de Benfica e F.C. Porto, o que dizer quando se olha para a 1ª divisão da Associação de Futebol de Aveiro? Lusitânia de Lourosa e Sanjoanense com 70 pontos, 22 vitórias cada em 26 jogos, 0 derrotas.

Disputa épica, sem paralelo nos campeonatos distritais espalhados pelo país. Por isso mesmo, ninguém se surpreendeu ao ver cerca de 4.500 pessoas em Lourosa para o duelo entre os dois clubes.

Há duas semanas, vários clubes da Liga roeram-se de inveja. Bancadas centrais cheias, moldura humana soberba para ver duas equipas puramente amadoras. Deu empate. Eram centenas de adeptos de São João da Madeira a par de milhares de adeptos locais.

O Maisfutebol foi à descoberta.

«O povo daqui adora o futebol»

«Se pensarmos que a localidade tem dez mil habitantes, é de facto notável. Foi um momento bonito. Em casa, temos sempre entre 1000 a 1500 adeptos. Mesmo fora, acompanham-nos sempre algumas centenas. O povo daqui adora o futebol», justifica Martelinho, treinador e campeão nacional pelo Boavista.

Martelinho é um filho da terra. Aliás, a proximidade entre equipa e povo justifica o cenário inusitado. «O Lourosa é o clube que mais gente arrasta para o futebol. Não gosto de usar o termo, mas há um certo bairrismo que une as partes», atalha o presidente, Vítor Teixeira. O pai dele foi jogador, treinador e sócio. Mais um exemplo.

«Basta dizer que temos mais de mil sócios pagantes, é ótimo», acrescenta o dirigente.

Os jogadores seguem a regra. Polícia, o capitão, conclui o raciocínio. «Sou da freguesia e sempre soube que as pessoas de Lourosa são loucas por futebol. Claro que a cobrança é maior, é um pau de dois bicos, mas numa altura em que se nota que as pessoas fogem dos estádios, acontece o contrário em Lourosa.»

«Parece a disputa entre Benfica e Porto»

Lourosa e Sanjoanense, Sanjoanense e Lourosa. O campeonato decide-se taco a taco. Sem derrotas após vinte e seis jornadas, o fosso para o terceiro lugar já vai nos 26 pontos. Impressionante.

«Há uma rivalidade mas sobretudo desportiva. As duas equipas estão um nível acima das outras e até mereciam subir ambas. Isso só será possível se houver alguma desistência por questões financeiras, como aconteceu no ano passado. De resto, iremos lutar até ao fim», frisa Vítor Teixeira.

Martelinho, agora treinador, concorda. «Parece a Liga, a disputa entre Benfica e Porto. Lourosa e Sanjoanense reforçaram-se muito. Ainda falta decidir o que acontece à Sanjoanense, pois um jogo recente foi interrompido por pretensa agressão dos adeptos ao assistente, quando estava 2-2. A AF Aveiro vai decidir. Se punirem a Sanjoanense com a derrota, ficamos à frente por um ponto.»

«Faltam oito jogos para o final e não há margem para errar. Empatámos os dois jogos com a Sanjoanense e estamos equilibrados nesse aspeto. Depois, as equipas podem perder pontos em qualquer lado. Aconteceu-nos isso na semana passada: empatámos em casa do penúltimo, num campo pelado», acrescenta Martelinho.

É o futebol em estado puro. Jogadores com estatuto de amadores, movidos pela paixão. Treinam quatro vezes por semana, às 18h30, folgam terça e sábado, jogam ao domingo.

«Trabalho é trabalho, futebol é paixão. O cansaço é relativo quando se faz o que se gosta», remata Polícia, o capitão. A história da sua alcunha pode ser lida em outro artigo. Tem tudo a ver com a alcunha de Martelinho e com a tradição de Lourosa. Uma realidade ímpar.