Antonio Adán está a 45 minutos de utilização em dois jogos de prolongar o seu vínculo com o Sporting até 2025. Esta é já a quarta época consecutiva enquanto titular indiscutível da equipa de Rúben Amorim, integrando a restrita lista dos apenas quatro jogadores mais utilizados desde 2020/21. Eles são Sebastián Coates, Nuno Santos, que deixou a posição de extremo para passar a ocupar a ala, Pedro Gonçalves, também polivalente no sistema de Amorim, e o guarda-redes espanhol de 36 anos.

Em Vila do Conde, Adán levou champanhe, de forma a antecipar as celebrações relativas à renovação automática do seu contrato, dissipando as dúvidas dos mais esquecidos e para desalento dos que não têm dúvidas há tempo suficiente para já não se esquecerem desta cláusula. Os últimos questionam-se a qual dos grupos pertencerá Rúben Amorim, na esperança de que este seja um daqueles casos em que haja incoerência entre o que o treinador vê e o que o treinador diz por uma questão de bom senso, de gestão do balneário. Estamos habituados a ouvir que, no futebol, tudo depende da interpretação de cada um. Bom, nem tudo. Existem interpretações erradas, opiniões que não cabem nem no maior dos espectros. Por exemplo, defender que, actualmente, Adán tem qualidade suficiente para ser o guarda-redes titular do Sporting.

A exibição frente ao Rio Ave não foi um acaso. Aliás, raros são os jogos em que Adán não revela as dificuldades ali exibidas, mas com atenuantes, que podem surgir separadamente ou combinadas: a pressão dos adversários não obriga a que a bola circule tanto pelo guarda-redes; colectivamente, a equipa encontra soluções para bater esse tipo de pressão sem solicitar tanto o guarda-redes; individualmente, há quem consiga bater esse tipo de pressão sem solicitar tanto o guarda-redes; os adversários não mostram eficácia na exploração da profundidade, quer por falta de trabalho colectivo, quer por acções individuais erráticas; a  equipa não permite que os adversários ganhem vantagem na exploração da profundidade; a equipa controla melhor o jogo com a bola, concedendo menos ataques aos adversários; a equipa controla melhor o jogo sem a bola, concedendo menos vantagens aos adversários no último terço; etc.

Por norma, estas atenuantes tendem a esbater-se à medida que o equilíbrio aumenta, porque, em cenários de superioridade clara a favor do Sporting, elas podem não ganhar impacto no desenrolar da partida, por isso é que a tendência importa no desenho de um perfil individual, mesmo que saibamos que, no futebol, o contrário da tendência pode ter um impacto brutal num resultado. Se, em Vila do Conde, Antonio Adán tivesse defendido uma das grandes penalidades e, consequentemente, o Sporting tivesse vencido o Rio Ave, isso não beliscaria a insuficiência qualitativa de Adán para o modelo de Rúben Amorim.

Sem esforço, os lances que se seguem poderão proporcionar déjà-vu. Porquê? Porque são uma tendência.

Lance 1

Pressão em bloco médio-alto do Rio Ave no momento de circulação do Sporting em primeira fase de construção
Coates recorre a Adán face à aproximação de Aziz
Diomande abre à direta para oferecer linha de passe a Adán, Gonçalo Inácio, à esquerda, nem tanto. Adán opta por recorrer ao jogo directo para Gyökeres. Fica a dúvida se esta opção, que se irá repetir em vários lances (tendência), é uma escolha individual ou uma indicação do treinador 
A bola de Adán sai boa para Gyökeres, que vai amortecer para Pedro Gonçalves 
Recorrer a Gyökeres para um jogo mais directo é uma opção que pode fazer sentido, tendo em conta o perfil do avançado sueco: sabe utilizar o corpo para ganhar vantagens sobre os adversários 
Pedro Gonçalves só não dá seguimento à jogada, porque sofre falta de Amine

Lance 2

Circulação do Rio Ave na primeira fase de construção. A altura da linha defensiva do Sporting exige a Adán que saiba controlar a profundidade 
A bola circula de Pantalon para João Graça, um dos jogadores do Rio Ave com mais qualidade no passe
Apercebendo-se do movimento de Aziz, João Graça procura colocar a bola nas costas da linha defensiva do Sporting. Adán tem todos os estímulos: linha defensiva alta, bola descoberta num jogador dotado no capítulo do passe e Aziz a ameaçar a profundidade 
Aziz consegue ganhar o espaço nas costas de Coates para receber a bola de João Graça. Entretanto, Adán já iniciou a saída da baliza
A utilização de frames corta a percepção real, mas Adán escolhe bem o timing para se antecipar a Aziz
Tendo chegado primeiro, Adán prepara-se para agarrar a bola, mas o gesto técnico é mal executado. Nesta imagem, vê-se que, na abordagem, é o pé direito de Adán que toca primeiro na bola
A bola foge do controlo de Adán e sobra para Aziz
Com Adán sem hipóteses de defender a bola, Aziz serve Úmaro Embaló, que surge sem oposição de trás para a frente 
Mesmo com Coates a proteger a baliza, Úmaro Embaló surge com muita vantagem para fazer o 2-1
Úmaro Embaló falha completamente a baliza do Sporting 

Lance 3 

Na sequência de um pontapé-de-canto (do lado direito do ataque) a favor do Sporting, há um alívio de qualquer maneira de Úmaro Embaló. A bola cai na zona de Geny Catamo 
Face à aproximação de Úmaro Embaló, Geny Catamo atrasa a bola para Adán 
Adán optou por travar a bola e procurar imediatamente o jogo directo, num contexto em que a equipa ainda se estava a reposicionar depois do pontapé-de-canto e Geny tinha todo o espaço do mundo para receber um passe do guarda-redes. Guardar a bola fazia ainda mais sentido, porque, na primeira-parte, o Sporting atravessou vários períodos em que não conseguiu mantê-la, frente a um adversário que fez o Sporting correr sem ela
A execução de Adán saiu com muita força para a zona de Hjulmand, que ainda se esforçou para captar a bola
Hjulmand não foi capaz de captar a bola e o Sporting perdeu a posse 

Lance 4

Depois de uma recuperação de Pantalon naquela zona, Costinha tenta ligar com Fábio Ronaldo 
Na sequência, Morita antecipa-se e recupera a bola para o Sporting 
Face à pressão adversária, Morita recorre a Adán 
Adán recebe a bola numa situação de 4x3 naquela zona do terreno
Aqui, Adán já decidiu o que vai fazer face à aproximação de Aziz
Ajeita a bola para o seu pé preferencial (o esquerdo) e espera a chegada de Aziz. Gonçalo Inácio está em condições de receber para depois jogar com Coates, já que a superioridade numérica se mantém, há espaço 
Adán opta por ludibriar Aziz, puxando a bola do seu pé esquerdo para o seu pé direito. Fica a dúvida se com a intenção de ligar com Coates, livre para receber 
O gesto técnico é mal executado e a bola fica à mercê de Aziz, rápido e ágil na pressão sobre o adversário 
Face à proximidade de Aziz, Adán acaba a pontapear a bola sem qualquer critério com o seu pé esquerdo
É Miguel Nóbrega quem fica na posse daquela bola, que caiu ainda no meio-campo defensivo do Sporting

Lance 5

Em circulação na primeira fase de construção, Nuno Santos falha a ligação com Pedro Gonçalves
A bola ressalta em Costinha e acaba por ir para a zona de Diomande 
Face à pressão do Rio Ave, Diomande recorre a Adán 
Neste frame não é possível ver Eduardo Quaresma, que abriu à direita de forma a oferecer linha de passe a Adán. Diomande fez o mesmo, mas Fábio Ronaldo fechou aquela linha de passe. Adán opta por recorrer ao jogo directo para Gyökeres
A bola de Adán sai boa para Gyökeres, que vai amortecer para Pedro Gonçalves
Há vantagens em jogar com um guarda-redes que proporcione muitas vezes este e outros cenários através do passe 

Lance 6 

Minuto 51 e o Rio Ave mantém a pressão em bloco médio-alto no momento de circulação do Sporting em primeira fase de construção
Diomande recorre a Adán 
Adán recebe a bola numa situação de 6x5 naquela zona do terreno, tendo Eduardo Quaresma a oferecer linha de passe à direita e Diomande a oferecer linha de passe à esquerda. Adán opta por recorrer ao jogo directo para Gyökeres
Até para um jogador como Gyökeres fica difícil ganhar todos os lances deste tipo. Além disso, é importante haver variabilidade na saída desde o guarda-redes, até para deixar o adversário na dúvida 
Apesar de ter ganhado a posição, Gyökeres escorrega e perde o controlo da bola 
O Sporting perdeu a posse 

Lance 7

Minuto 58 e o Rio Ave mantém a pressão em bloco médio-alto no momento de circulação do Sporting em primeira fase de construção. Eduardo Quaresma recorre a Adán 
LAdán recebe a bola numa situação de 6x5 naquela zona do terreno, tendo Eduardo Quaresma a oferecer linha de passe à direita e Diomande a oferecer linha de passe à esquerda. Adán opta por recorrer ao jogo directo para Gyökeres (onde é que eu já li isto?) 
Até para um jogador como Gyökeres fica difícil ganhar todos os lances deste tipo. Neste caso, disputa a bola sem qualquer vantagem 
O Sporting perdeu a posse 

Lance 8

Já nem se pode exigir que, depois de Diomande travar a iniciativa de Aziz e atrasar a bola para Adán, o guarda-redes, perante este contexto, coloque a bola no (desesperado) Hjulmand, mas... 
...o Sporting voltou a perder a posse

Lance 9

Circulação do Rio Ave em fase de criação. A altura da linha defensiva do Sporting exige a Adán que saiba controlar a profundidade (onde é que eu já li isto?). Apercebendo-se do movimento de Aziz, Vrousai procura colocar a bola nas costas da linha defensiva do Sporting. Adán tem todos os estímulos: linha defensiva alta, bola descoberta e Aziz a ameaçar a profundidade 
Por este frame, já é possível perceber que Adán estava mal posicionado, porque vem a recuperar metros para a sua direita. Aziz já ganhou o espaço nas costas de Eduardo Quaresma 
Adán está claramente atrasado para chegar àquela bola 
Aziz chega à bola primeiro do que Adán, adianta-a e o guarda-redes derruba o avançado dentro da grande-área 
No lance da primeira-parte, contou com um falhanço escandaloso de Úmaro Embaló. Desta vez, num lance semelhante, volta a falhar no controlo da profundidade e comete grande penalidade 

Lance 10

Minuto 75 e o Rio Ave mantém a pressão em bloco médio-alto no momento de circulação do Sporting em primeira fase de construção. Diomande recorre a Adán
Eduardo Quaresma abriu à direita de forma a oferecer linha de passe a Adán, Diomande fez o mesmo, mas Fábio Ronaldo fechou aquela linha de passe. Adán opta por recorrer ao jogo directo para Gyökeres numa situação de 7x3 naquela zona do terreno 
A execução sai muito mal a Adán, tendo a bola caído ainda no meio-campo defensivo do Sporting e...
...o Sporting perde a posse

Em 2020/21, a contratação de Adán fez sentido. Renan Ribeiro e Luís Maximiano não davam garantias, o modelo de Rúben Amorim resguardava os problemas do guarda-redes espanhol e chegou ao Sporting como jogador livre. Hoje, num modelo que monta a linha defensiva numa altura bem mais adiantada do campo, exigindo ao seu guarda-redes resposta no controlo da profundidade, que arrisca bem mais na primeira fase de construção, exigindo ao seu guarda-redes resposta no jogo com os pés, que envolve mais jogadores no processo ofensivo e, além disso, opta por apostar em perfis individuais bem diferentes - ter Luís Neto e Feddal enquanto centrais e Nuno Santos enquanto extremo é muito distinto de ter Gonçalo Inácio e Matheus Reis enquanto centrais e Nuno Santos enquanto ala -, expondo-se, de outra forma, aos ataques contrários, não há espaço para alguém que encontra nessas exigências as suas principais limitações.

O modelo mudou. O champanhe estava azedo.