Era uma vez três ossos numa prateleira de supermercado: um osso grande, um osso pequeno e um osso mais ou menos. Vendo que o osso mais ou menos estava sério, cabisbaixo e com umas olheiras tal que parecia o Rui Alves depois de uma noite mal dormida, o osso grande perguntou-lhe:

- O que tens, osso mais ou menos? Por que estás tão triste?
- Estou apreensivo com o futuro - respondeu-lhe o osso mais ou menos.
- Pareces o Bruno de Carvalho. Também vais emitir um comunicado?

O osso grande e o osso pequeno riram-se entre eles com algum histerismo.

- E vocês parecem o Ricardo. Riam-se à ossos adultos, pá! - atirou o osso mais ou menos. - Estou triste porque já sei que com a sorte que tenho vou parar a casa do Luis Suárez. Pode ser uma experiência dolorosa.
- Estás triste por isso? - questionou com um tom retórico de porta voz do governo o osso pequeno. - Ouvi dizer que o Luis Suárez morde muito bem. De certeza que vais ficar bem. Ele vai tirar essa carne toda à tua volta, vais ficar limpinho, perfeito e enxuto como o Raul Meireles antes de se tornar Amish.
- Ele não é Amish - respondeu o osso mais ou menos. - É um monge cristão ortodoxo.
- E tu agora parecias o Rui Santos. Deixa-te de observações ridículas.

O osso mais ou menos não se sentiu atingido por aquela comparação ofensiva e soltada num tom grave de treinador do FC Porto depois de uma derrota. A verdade é que tinha coisas mais importantes em que pensar.

Houve um dia em que concentrou em si todos os sonhos. Sonhou alto. Sonhou ser levado por António Fiúsa e tornar-se mediático: podia, por exemplo, simbolizar um osso do galo de Barcelos original. Teria direito a uma almofada sobre a qual podia descansar todas as noites, alguém lhe faria a limpeza uma vez por semana, seria exibido sob aplausos do público nos jogos em casa.

Seria enfim um osso aristrocático, nas mãos de um homem do povo mas com um bom pé de meia: e muitas meias para proteger um pé.

Mas esses tinham sido sonhos de outro tempo: um tempo em que era permitido sonhar. Antes de Luis Suárez morder uma, duas e três vezes. Agora era um tempo de medo.

- Mas final qual é o problema dele? - perguntou o osso mais ou menos. - Aquilo é um caso psiquiátrico, não é?
- Não - respondeu o osso grande. - É um caso iliterário. É mais ou menos como Jorge Jesus, e ninguém vai mudar o contrário do meu pensamento.

O osso mais ou menos olhava para o osso grande com aqueles olhos esbugalhados de Bruno Martins Indi, mas em vermelho: do efeito das carnes ainda à volta dele.

- Ele não percebe o sentido de uma metáfora - acrescentou o osso grande. - Dizem-lhe para morder os calcanhares dos adversários, e ele morde-lhes tudo. Ouve no balneário que tem de entrar no relvado com vontade de os comer, e ele come-os mesmo. Literalmente.

O osso pequeno ouvia esta conversa em silêncio. Até que achou que era altura de falar.
- A vossa conversa é como este texto: ridícula.
- Este texto não é ridículo. É non sense - retribuiu-lhe o osso mais ou menos. - Non sense também é bom. Ridículo é um ser humano adulto morder outro.

Estava a acabar a frase quando sentiu umas mãos apertá-lo. Olhou assustado, tentou perceber quem era. Chegara finalmente a sua hora e sentia-se ainda mais assustado. Viu uma pele muito branca, viu um pescoço extremamente largo. Foi tudo numa questão de segundos até que por fim viu a cara.

- Não, não, NÃOOOOO. SOCOOOOOOORRROOO. Ajudem-me... ELE VAI VOMITAR-ME EM CIMAAAAAAAAA.

Era Lionel Messi, sim.

- SUÁREZ. SUÁÁÁÁÁÁREZZZZZZZZ. ONDE ANDAS? SUÁÁÁÁÁREEZZZZ.

«Box-to-box» é um espaço de opinião de Sérgio Pereira, jornalista do Maisfutebol, que escreve aqui às sexta-feiras de quinze em quinze dias