Desaev. Kahn. Schmeichel. Buffon.

De trás para a frente, e da frente para trás.

Achava piada a Pfaff e meto-o aqui pelo meio, se vocês pestanejarem ou se distraírem um pouco.

Também Preud’Homme poderia vestir capa de herói naqueles filmes que podemos continuar a ver como se crianças fôssemos, já depois de termos dado entrada no clube dos mais entradotes.

Era uma boa escola, a belga. Ainda é. Apesar de um ou outro De Wilde menos impressionante.

Não cheguei a tempo de Maier. De Banks conheço e reconheço o melhor voo picado de todos os tempos, insustentável kamikaze a fugir aos radares inimigos para evitar o cabeceamento-golo de Pelé.

Terão havido outros, que encaixem melhor noutras opiniões.

Por cá, Manel Bento, e dois Vítor: Damas e Baía, claro.

Bento começa a ensinar-me cedo que não há impossíveis. Ergue-se, pasme-se, a 1,74 metros do solo. Menos 8 centímetros do que Damas, 11 que Baía.

Menos sete que eu, que nunca aspirei a ser guarda-redes. Só a chateá-los.

Faz coisas de gente grande, porque é enorme na sua inconsciência. Enche-se de uma alma de gigante, não ouve as vozes de aviso na sua cabeça, e salta andar-e-meio para agarrar a bola.

O primeiro Vítor joga de smoking, cheio de maneiras.

Ora permita-me que defenda, por obséquio.

Com certeza, caro senhor.

O segundo veste Armani e faz pose para as fotografias. Elegante, mas popular. Muito. Cresce entre a elite, herdeiro intocável da baliza.

O Europeu põe Patrício perto dos grandes do burgo, sim. Nunca será tão elegante ou eloquente como os antecessores, mas irá ver ser escrito o seu nome muitas vezes no quadro de funcionário do mês. Exemplar, sóbrio e competente. Mais maduro, mais resistente à pressão, cada vez mais senhor do seu espaço. O tempo colocá-lo-á perto dos outros, talvez até dê mesmo para ultrapassá-los.

É que o talento desses ainda nos enche a memória. A mim, pelo menos.

O meu guarda-redes é, no entanto, um super-homem imune à kryptonite. Podia ser um Grand Danois a desafiar a gravidade, um glaciar soviético a bloquear a passagem, até mesmo um Rottweiler alemão a sair da baliza, mas é talvez uma mistura disso tudo, criada em Parma, fermentada em Turim.

Buffon.

Aos 39, continua a ser Buffon.

É verdade que já gastou algumas das suas nove vidas - sempre achei que eram nove -, e não cai sempre de pé. Os reflexos são de um felino mais tranquilo, mas ainda não pronto para a ociosidade da vida.

De cada vez que parece que o fim se aproxima, Gigi volta a rejunescer. A voar para a bola como se tivesse 20 anos outra vez. Ou 30, não quase 40. E a querer continuar, sem fim à vista.

É verdade que há Courtois. Neuer. Oblak. De Gea. E tantos outros tão bons. Melhor que bons. Candidatos a heróis.

Só que nenhum ainda me impressionou tanto como Buffon perante o avançado.

E, por isso, é o meu Super-Homem, e é imune à kryptonite.

«ERA CAPAZ DE VIVER NA BOMBONERA» é um espaço de crónica, publicado de quinze em quinze dias na MFTOTAL. O autor usa a grafia pré-acordo ortográfico.