A 19 de maio de 2010, há precisamente quatro anos, na sua primeira grande final como jogador do At. Madrid, Tiago deixou o Camp Nou assim, em lágrimas: a sua equipa tinha acabado de ser derrotada pelo Sevilha (2-0), na final da Taça do Rei, com golos de Capel e Jesus Navas. Na altura, uma Taça do Rei parecia o patamar mais alto de ambição permitido aos «colchoneros» e ao seu médio, emprestado pela Juventus, em janeiro desse ano.

No último sábado, porém, o internacional português começou a acertar contas com o destino: as lágrimas que soltou no relvado do Barcelona, após o empate 1-1 que selou o 10º título de campeão do At. Madrid, foram de alegria. Duas semanas depois de completar 33 anos, numa altura em que seria legítimo pensar-se no ocaso de um grande jogador, Tiago Cardoso Mendes iniciou da melhor maneira aquela que pode ser a semana mais rica e decisiva de uma carreira brilhante.



Para já, o médio português tornou-se campeão em três Ligas diferentes, depois dos títulos conquistados em Inglaterra (pelo Chelsea, em 2004/05) e em França (pelo Lyon, em 2005/06 e 2006/07). Faltou-lhe o título italiano, numa experiência pouco feliz em Turim, que coincidiu com uma fase conturbada da vida do clube. Mas é, ainda assim, um feito que no futebol português só tem paralelo com o logrado por Deco (campeão em Espanha, com o Barcelona, em Inglaterra, com o Chelsea, e no Brasil, com o Fluminense).

O «mágico» lusobrasileiro ainda tem um duplo avanço: foi campeão em Portugal, pelo FC Porto (Tiago só venceu a Taça pelo Benfica, em 2004) e, principalmente, sagrou-se campeão europeu em 2004, pelos portistas, e em 2006, pelo Barcelona. Também aí, Tiago terá uma palavra a dizer, no próximo sábado, num estádio da Luz onde já foi feliz: o ajuste de contas com a glória europeia, que lhe faltou nas finais de Liga Europa de 2010 e 2012, onde não pôde atuar, poderá chegar com juros, se o Atletico Madrid completar, diante do Real, a dupla conquista que constituiria uma das maiores proezas – e surpresas - das últimas décadas.

Ao contrário das consagrações em Inglaterra e em França, conseguidas ao serviço de clubes que faziam figura de favoritos, a vitória «colchonera» na Liga, ao fim de 18 anos, – e perante adversários diretos com orçamentos quatro vezes superiores - tem uma dimensão épica, que faz dela a mais saborosa de todas as que o médio português já conseguiu. Para mais, num jogo em que, ainda na primeira parte, se viu privado das suas maiores figuras - a palavra «estrelas» é inadequada a uma equipa que não as tem. Algo que foi devidamente sublinhado pela ovação tributada pelos adeptos catalães, numa demonstração de grandeza que o treinador Simeone sublinhou no final dos festejos:



A consagração do médio português – que com 23 jogos na Liga e 6 na Liga dos Campeões foi conquistando espaço, e influência, ao longo da temporada nas opções de Simeone – surge na semana em que Paulo Bento vai anunciar os 23 convocados para a campanha da Seleção Nacional no Mundial do Brasil. Uma coincidência que mais reforça o lamento comum à maioria dos adeptos portugueses: frustrado por nunca conseguir estatuto de indiscutível, tanto na era Scolari como na era Queiroz, Tiago renunciou à equipa nacional, cedo de mais, no rescaldo do Mundial sul-africano.

O seu regresso está fora de hipótese para todas as partes, situação que assumiu, com naturalidade e alguma tristeza, depois da eliminação do Chelsea na meia-final da Liga dos Campeões. Na semana de todos os acertos de contas com o destino, vai ficar a faltar-lhe esse, o de uma grande competição de seleções onde atinja plano de destaque. Para já, resta-lhe Lisboa, para o jogo de toda uma vida e a última decisão de uma temporada de ouro, antes de resolver um futuro profissional em aberto – a proposta de renovação com o At. Madrid não é, seguramente, a única que tem entre mãos. E um eventual novo título de campeão, num quarto país, deixá-lo-ia num patamar a que, para além de Deco, apenas Ibrahimovic, Beckham, Robben, Anelka e Sneijder atingiram recentemente.