Quando, a partir das 20 horas desta segunda-feira, o árbitro Mike Dean apitar para o início do Manchester City-Chelsea, no Etihad Stadium, será bem mais do que a definição das hierarquias a da Premier League a estar em causa.

É verdade que, em caso de vitória, o City volta a ultrapassar o Arsenal no topo da tabela e deixa a equipa de José Mourinho a seis pontos, culminando uma sequência de 21 jogos sem derrota - a melhor dos últimos 67 anos. Já um empate, ou uma vitória do Chelsea, será um importante atestado de solidez para uma equipa que, desde a chegada de Mourinho, tem dado sinais de instabilidade, mas nunca deixou de manter o contacto com o pelotão da frente.

Mas há muito mais nesta história. O jogo põe frente a frente dois dos plantéis mais caros do futebol atual. O estudo recente do «Football Observatory» atribuía, respetivamente, o segundo lugar ao Manchester City (um total de 435 milhões de euros investidos em contratações, dos quais cerca de 110 já com Pellegrini) e o quarto ao Chelsea (376 milhões, dos quais cerca de 115 já nesta época, com Mourinho). Líder incontestado nesta tabela, o Real Madrid, um clube que, curiosamente, é elo comum na carreira de dois treinadores que não têm propriamente boas memórias do Bernabéu e, muito menos, relações calorosas entre si.

Mourinho-Pellegrini: o Real Madrid em comum

O reencontro de Manuel Pellegrini com José Mourinho – o nono nas respetivas carreiras – terá sempre um picante especial. A vantagem do português é clara (seis vitórias, um empate e uma derrota, com 26-9 em golos), quase tão clara como a animosidade entre os dois.

Mourinho sucedeu a Pellegrini no comando do Real Madrid na primavera de 2010, depois de o chileno ter cumprido uma temporada no Bernabéu, sem títulos, mas com o que era então recorde de pontos. Desde o princípio, não desperdiçou a ocasião de marcar as diferenças para com Pellegrini, até para superar o facto de este ter deixado boa imagem na imprensa de Madrid.

Quando, a meio da primeira temporada de Mourinho em Espanha, se proporcionou o primeiro reencontro (Pellegrini tinha entretanto substituído Jesualdo Ferreira no Málaga), o técnico português teve uma frase que causou mal-estar: «Se um dia deixar este clube, sei que não vou treinar o Málaga, vou para um grande da Premier League ou da Série A», afirmou. A goleada sobre a equipa orientada pelo antecessor (7-0) acentuou a inevitabilidade de um relacionamento tenso que se prolongou no primeiro frente a frente em Inglaterra, já em outubro deste ano.

Nessa ocasião, depois de um jogo equilibrado, o Chelsea chegou à vitória em período de descontos, com um golo de Torres. Mourinho festejou-o efusivamente, numa zona próxima do banco do City e Pellegrini sentiu-se provocado, evitando apertar a mão ao técnico português no final: «Não o cumprimentei porque não quis. Os festejos? Não esperava nada de diferente, foi o normal», disse. Mera coincidência, garantiu Mourinho na sala de imprensa: «Estava à procura do meu filho na bancada, o lugar dele é perto do banco adversário, isso vai ter de mudar. Se os elementos doCity acreditam nesta explicação, ótimo. Se não, peço desculpa por qualquer atitude que eles tenham julgado inapopriada», disse então.

Man. City: imparável ou nem tanto?

Três meses depois, a equipa de Pellegrini recuperou totalmente de um início de época atribulado, e está transformada na maior máquina goleadora de que o futebol inglês tem memória, com 115 golos em jogos oficiais desde o início da época. Desde finais de novembro tem uma sequência de 18 vitórias e dois empates, com superioridade manifesta sobre os concorrentes diretos que enfrentou pelo caminho.



Mesmo com a ausência, por lesão, de Aguero, que estava a atravessar um dos melhores momentos da carreira, é difícil não projetar este jogo como um confronto entre o poder de fogo do City e o pragmatismo do Chelsea, que esta época já se exprimiu em empates arrancados em casa de concorrentes diretos como o Manchester United, o Arsenal e o Tottenham (apenas um golo sofrido nestes três jogos).



À sua maneira, Mourinho, que também já não perde um jogo oficial desde 23 de dezembro, tem prestado tributo à competência do adversário, que já identificou como principal candidato ao título. Nas últimas intervenções públicas, tem endereçado todo o favoritismo ao City, aproveitando para pôr alguma pressão extra num adversário que vai voltar a enfrentar a meio do mês, para a Taça: «Falando objetivamente, têm estado muito mal nas últimas edições da Liga dos Campeões, tal como na Liga Europa. Têm uma equipa fantástica, mas deviam ter mais títulos», afirmou no lançamento do jogo desta segunda-feira.

Fiel à sua imagem reservada, e pouco expressiva, Pellegrini evitou o diálogo direto, mas não deixou de aludir à falta de espectacularidade do Chelsea: «Têm o seu próprio estilo de jogar, que talvez não seja o mesmo estilo de que eu gosto, mas todos podem jogar como quiserem», afirmou, menos de uma semana depois de Mourinho ter criticado o estilo ultradefensivo do West Ham, apelidando-o de futebol do século XIX. Apenas mais uma acha na fogueira de expetativas, um entre dezenas de pretextos para não perder pitada de um clássico de novos-ricos a valer 810 milhões.