O mea culpa chega com a mesma naturalidade, quase ingénua, com que arranca para cima dos adversários. Bebé é assim, um talento riquíssimo em estado bruto, tanto nos relvados como a dar entrevistas.

Esta, exclusiva ao Maisfutebol, permite perceber o falhanço do atacante no Manchester United. Como o próprio reconhece, sair de Portugal com 19 anos, e diretamente para Old Trafford, não é para qualquer um.

O Bebé precisava de dar este passo atrás na carreira, regressando a Portugal?

«Claramente. Acho que saí demasiado cedo do meu país. Nem tinha jogado na I Liga e fui logo para o ManUtd, rodeado de craques e monstros sagrados. Devia ter ficado pelo menos uma temporada no Guimarães».

Como foi o dia em que soube do interesse do Manchester United?

«Foi tudo repentino, inesperado. Estava no treino e o presidente do Vitória chamou-me. Disse-me que tínhamos de ir depressa a casa do empresário Jorge Mendes. Pensei que era para assinar por ele, porque eu não tinha empresário. Quando cheguei lá, o Jorge cumprimentou-me, sorriu e deu-me a notícia: queres ir para o Manchester United? Sim? Então vais. Não acreditei. Pensei que ele estava a gozar comigo, honestamente».

Imagino que os primeiros dias em Manchester tenham sido inesquecíveis.

«É incrível recordar tudo isso. As pessoas do clube ajudaram-me bastante, aprendi muita coisa. A primeira semana foi difícil. Eu estava muito envergonhado e não falava com ninguém. Só queria estar no meu canto, a observar. Ainda me lembro dos dias em que estava na Casa do Gaiato e sonhava em ser um daqueles jogadores».

Quem foram os jogadores que o ajudaram mais?

«O Anderson e o Nani, claro, por falarem português, e o Patrice Evra. Fiquei a viver dois meses em casa do Anderson. Foi ótimo, ele mostrou-me tudo no clube e na cidade. Dizia-me o que eu estava a fazer bem e mal. Agradeço-lhe para sempre essa ajuda».

O que lhe correu mal no Manchester United? Já refletiu sobre isso?

«Os meus colegas mais experientes diziam que eu facilitava nos treinos. É verdade. Pensava: estou aqui, ganho bem, não tenho de me esforçar todos os dias. A culpa foi só minha. Brincava demasiado. Quando tentei ir pelo caminho certo já era tarde. Se pudesse voltar atrás, mudava muita coisa no meu comportamento. Levava o ManUtd na brincadeira e todos os outros levavam tudo muito a sério. Davam-me na cabeça e ficavam tristes comigo, com razão».

Foi por isso que acabou por ser cedido ao Besiktas? O ManUtd queria que aprendesse a ser responsável?

«Sim, queriam que eu mudasse a forma como encarava a profissão. Eu estava de férias e o Jorge Mendes telefonou-me a dizer que eu ia para o Besiktas. Pareceu-me bem porque estavam lá muitos portugueses. Achei que seria difícil ser titular, porque estavam lá o Hugo Almeida e o Simão, mas encaixei rapidamente e arranjei o meu espaço. Estava bem até me lesionar gravemente».

Havia outros portugueses...

«O Quaresma é um grande jogador. É um bocado como eu. Moinas (risos). Se quisesse era um dos melhores do mundo. Podia ter tido outra carreira. Faz magia com a bola. A cabeça é tramada. O Manuel Fernandes é outro igual. Joga muito. Devia estar na seleção, mas também é cabeça dura. Têm tudo, recebem bem e se calhar facilitam. Qualidade têm, são top mundial».

Em 2012 regressou ao United, mas esteve quase sempre nas reservas.

«Fiz uma boa pré-época com o plantel principal e o Ferguson até me elogiou publicamente. Depois nunca me pôs a jogar. Disse-me que eu ia ser uma boa dor de cabeça e afinal não apostou em mim. Amuei, desmotivei-me e caí um pouco. Estou mais feliz agora, no Rio Ave».

Jogar num dos grandes portugueses é um cenário que lhe agrada?

«Gostava de jogar no Sporting, identifico-me com o clube».

O Bebé vai ser um dos melhores jogadores portugueses?

«Quero ser e posso ser. Tenho qualidade para isso».