Jornalismo é a nova profissão de Quinito. Queria ser suinicultor, acabou jogador, depois treinador, agora é jornalista e administrador. O Maisfutebol pôs à prova aquele que antes estava de um lado da barreira, agora está do outro. Quinito não fugiu, e respondeu como... jornalista.

«A tarefa dos jornalistas não é fácil», começa por dizer Quinito. As relações entre profissionais da informação e desportistas nem sempre é a melhor. Quinito acha que há mais distanciamento. «Cavou-se um fosso entre jornalistas e treinadores», revela, e explica porquê: «Há muita competição, e por isso, não existe tempo para uma maior aproximação e amizade, mesmo tendo em conta que se corre no fio da navalha em relação à honestidade e crítica.»

Quinito faz, então, o paralelismo com aquilo que acontecia no passado. «Antes havia essa aproximação e grandes amizades entre jornalistas, treinadores e jogadores de futebol. E não existia promiscuidade. Não quer dizer que agora não haja jornalistas de grande qualidade mas a verdade é que naquela altura havia grandes homens. Mais que jornalistas, eram homens.»

Quinito admite que o panorama actual na imprensa desportiva não é o melhor. A tendência, diz, é para piorar porque existe a ideia de uma «guerrilha» entre quem quer informar - os jornalistas - e quem cede a informação - treinadores e jogadores. «Dá a ideia de que outro lado da barreira está o inimigo, e deste lado estou eu. E que estou contra ele, e ele contra mim. Depois começaram a aparecer os treinos à porta fechada, os blackouts e estreitou-se a relação», lamenta.

«Há quase uma relação de inimizade. Esse muro entre jornalistas e treinadores tem que ser derrubado», afirma Quinito, que acrescenta a solução: «Vão ter que ser os treinadores a dar o passo de aproximação. Eu lutei sempre por isso. Terão que ser eles a pensar nisso». No entanto, os treinadores não são, para o ex-técnico, os únicos culpados.

«Desde que aparecerem as SADs que as coisas ficaram mais extremadas. Eu sou do cachecol, da bandeira e do clube. Eu nunca fui um defensor da SAD, mas, tal como os computadores, penso que não vale a pena lutar contra isso. É irreversível. Tal como não há forma de ser director de um jornal a escrever à mão. É uma guerra perdida», revela Quinito.

«Segui críticas que me iluminaram o êxito»

Na leitura que o ex-técnico faz da imprensa desportiva actual, Quinito pensa que a competitividade piora a qualidade de informação. Ainda assim os jornalistas têm que ser treinadores de bancada. «Se o grande exercício do futebol é ser treinador, então o jornalista para informar tem que ser, forçosamente, treinador de bancada. Vestir a pele do treinador», afirma.

«Penso que temos jornais a mais», alerta Quinito. «É uma guerra à procura da informação, da cacha, da antecipação. O jornalista desportivo de agora já não relata o que vê, já está a antecipar porque sabe que tem que arriscar. Porque sabe que se não arriscar será outro. Esta competição desenfreada e a velocidade com que tudo se processa obriga o jornalista a passar a 'red-line'», afirma o ex-treinador.

Quinito afirma que nunca passou por nenhuma situação extrema com os jornalistas. Pelo contrário, diz que tem bons amigos e confessa que durante o tempo em que foi treinador, seguiu algumas críticas que o ajudaram. «Fui tantas vezes criticado. Algumas vezes injustamente. Agora posso dizê-lo: muitas vezes houve críticas que foram a luz que iluminaram alguns êxitos que consegui», confessa.

Sentiu-se injustiçado numa situação particular. O FC Porto tinha vencido a Taça Intercontinental e Quinito foi convidado para orientar a equipa na época seguinte. «Fui muito criticado quando pedi autógrafos aos jogadores do FC Porto que tinham sido campeões do mundo nesse ano. Mas tinha que fazer aquilo porque era o que sentia. Admirava os jogadores que treinava», revela.

A imprensa, o fado e... Espanha

Quinito esteve quatro anos em Espanha, onde jogou no Santander. Não sentiu a agressividade da imprensa espanhola, mas revela que há diferenças com o que se passa em Portugal. Para o antigo treinador tudo não passa de... fado.

«Somos o povo do coração grande e quente. Por cultura, gostamos mais de chorar. É o fado. Por isso mesmo, em relação à Espanha, a imprensa desportiva não é tão agressiva. Ainda bem», suspira.

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