Mais ou menos por volta do século quinto antes de Cristo, quando o império persa ressuscitava e com uma só batalha arrasava a Babilónia, o sábio Lao Tzu escrevia as primeiras linhas da teoria da dualidade: a base do taoísmo.

O yin e o yang.

Teorizava Lao Tzu que tudo neste nosso universo, a que delicadamente chamamos casa, se calcula com base na direta proporcionalidade do oposto.

"Conseguimos perceber que uma é coisa bonita porque há outra que é feia."

No fundo, lá está, é ver o mundo construído sobre antíteses: através de dois polos em oposição. Bom e mau. Escuro e claro. Rico e pobre. Longo e curto.

Sporting e Benfica, acrescento eu.

Nunca como por estes dias o taoísmo explicou tão bem os dois rivais de Lisboa: exatamente porque nunca como por estes dias Sporting e Benfica foram tanto uma coisa e completamente o contrário dela.

O mérito do campeão só se torna um conceito óbvio, como tudo na teoria dos opostos, porque ao lado existe um certo demérito do vizinho.

O Benfica, por exemplo, tem um líder discreto e que raramente fala. O Sporting, por outro lado, tem um líder impulsivo, que precisa de ter constantemente os holofotes apontados a ele. Um líder que fala muito, e muitas vezes mal.

O Benfica é um clube pacificado e sincronizado. Já o Sporting está em guerra com tudo e com todos. Está em guerra até com ele. Com isso desperdiça tempo e energia. Torna-se mais instável do que uma bolsa de valores.

Por falar em estabilidade, o Benfica mantém o mesmo treinador há seis anos. O Sporting, nos mesmos seis anos, teve onze treinadores: o que dá uma média de quase dois treinadores por época.

O Benfica aprendeu com os erros. Soube manter Jorge Jesus quando o técnico perdeu tudo no fim, apostou num trabalho de continuidade, evoluiu com a experiência adquirida em anos maus. O Sporting não aprende: repete todos anos os mesmos erros e todas as épocas começa, outra vez, do zero.

O Benfica vai tendo dinheiro para investir, construiu uma base de olheiros e tem capacidade para contratar um ou outro bom jogador. O Sporting, esse, reforça-se com jogadores que raramente são capazes de se tornar opção.
 
Mas há mais, claro.

O Benfica aprendeu a ter um futebol adulto e ponderado. Começou por fazer um jogo descomedido, mas com o tempo acrescentou-lhe prudência: consegue resultados aceitáveis nos jogos grandes e afirma-se nos jogos pequenos.
 
O Sporting, por outro lado, expõe-se ao heroísmo nos desafios exigentes, mas falha muitas vezes nos jogos mais fáceis. Somou seis empates, e perdeu doze pontos, em Alvalade. Os jogos são, por isso, imprevisíveis.

O Benfica foi duas vezes campeão. O Sporting não.

O yin e o yang, lá está.

Mas espera lá, dirá o leitor nesta altura: este texto só serve para melindrar o Sporting? Não, não serve. Serve para afirmar que não tinha de ser assim.
 
Bruno de Carvalho fez coisas muito boas no Sporting. A recuperação financeira, por exemplo, elogiada até pela UEFA. Mas sobretudo compreendeu que uma bandeira de um clube não é nada se não tiver gente por detrás a segurá-la.
 
Valorizou os adeptos, no fundo. Os sportinguistas regressaram ao estádio, voltaram a consumir futebol, conseguiram outra vez entusiasmar-se.
 
A gestão do futebol, porém, repete alguns erros de direções passadas. Convinha aprender com eles, e já agora com o longo trajeto que o rival cumpriu para chegar aqui.
 
Aproximar-se, no fundo, do bom que foi feito do outro lado da estrada.
 
Afinal de contas o taoísmo tem dois mil e quinhentos anos: já vem do tempo em que os persas arruinaram a Babilónia.
 
Box-to-box» é um espaço de opinião de Sérgio Pereira, jornalista do Maisfutebol, que escreve aqui às sexta-feiras de quinze em quinze dia