Efeméride é uma rubrica que pretende fazer uma viagem no tempo por episódios marcantes ou curiosos da história do desporto, tenham acontecido há muito ou pouco tempo. Para acompanhar com regularidade, no Maisfutebol.
 
28 de junho de 1994. Há 21 anos. Rússia e Camarões defrontaram-se num jogo que, à partida, tinha poucos motivos de interesse. Mas provou exatamente o contrário e acabou por ficar na história com dois recordes que ainda hoje perduram. Os responsáveis: Oleg Salenko e Roger Milla.
 
Estávamos na terceira jornada da fase de grupos do Mundial dos Estados Unidos. A Rússia já tinha perdido com Brasil e Suécia e só podia aspirar ser um dos melhores terceiros a apurar-se. Os Camarões tinham uma esperança ligeiramente maior, graças ao empate com a Suécia.
 
As duas seleções acabariam por ficar pelo caminho, mas havia mais em jogo e, naquele relvado de Stanford, California, dois jogadores talhados para as andanças dos Mundiais viriam a escrever o nome nos anais da história do futebol.
 
O primeiro foi Oleg Salenko. O avançado russo, que jogava então no Logroñés, de Espanha, e disputava o primeiro Mundial da carreira.

Esperava ter sido convocado em 1990 para representar a URSS, mas ficou de fora. Com o fim da União Soviética, Oleg Salenko jogou três encontros pela Ucrânia, só que, como a FIFA ainda não reconhecia oficialmente a seleção ucraniana, pôde, em 1993, jogar pela Rússia.

1994 era então o primeiro Mundial da Rússia e de Oleg Salenko. Já tinha marcado o único tento na derrota frente à Suécia e depois, frente aos Camarões, tirou a barriga de misérias. Começou logo aos 15 minutos e ao intervalo já tinha três na conta pessoal.

 

A perder por 3-0 ao intervalo, o selecionador dos Camarões fez entrar a arma secreta, o homem que fez dos camaroneses a seleção surpresa de 1990: Roger Milla.
 
Este era o terceiro Mundial do veterano Roger Milla. O primeiro tinha sido em 1982, em Espanha. Na altura deu nas vistas, mas não marcou qualquer tento. Repetiria a presença, em 1990, já com 38 anos, desta vez em Itália. Jogava então num pequeno clube da Ilha de Reunião e parecia estar já na reta final da carreira, mas, por influência do Presidente da República, acabou por ser convocado.
 

 
Os adeptos não gostaram, protestaram, mas Milla calar-lhes-ia o descontentamento com golos. Marcou dois à Roménia, que lhe valeram o lugar como titular, e, nos oitavos-de-final, quando os Camarões eliminaram a Colômbia no prolongamento, Roger Milla teve a desfaçatez de humilhar El Loco Higuita.

Num dos mais célebres momentos da enciclopédia mundialista, Milla não se impressionou com o drible kamikaze de Higuita, roubou-lhe a bola e borrou-o de vergonha. «Ele tentou driblar-me e ninguém dribla o Milla», diria depois.
 
 

E não é preciso ter grande memória, nem fazer muitas contas, para perceber que foi um Roger Milla de 42 anos que entrou em campo no jogo frente à Rússia, em 1994. Subiu ao relvado para a segunda parte e, menos de um minuto depois de estar em jogo, mostrou que as pernas não sentiam o peso da idade, e marcou o único tento dos Camarões nesse encontro.
 
No jogo anterior, frente ao Brasil, tinha-se tornado no jogador mais velho a atuar numa fase final de um Campeonato do Mundo [ recorde que durou até ao Mundial do Brasil]. Com o golo frente à Rússia, passou a ser o mais velho a marcar num Mundial. E neste feito ainda ninguém conseguiu superá-lo.
 
E Oleg Salenko? Não, não nos esquecemos dele... e os camaroneses também não. O russo marcou mais dois golos na segunda parte [Dmitri Radchenko fez o 6-1 final]. Uma mão cheia de tentos nesse encontro, que valeu a Oleg Salenko o título do jogador que mais golos marcou num só jogo de uma fase final do Mundial. 
 


De início, Salenko ele não se deu conta do recorde: «mais tarde, no final do jogo, quando eu tirava fotografias com Roger Milla, é que me explicaram», contou.

Na época pensava-se que tinha igualado o uruguaio Juan Alberto Schiaffino, que teria feito cinco golos num 8-0 na Bolívia no Mundial de 1950. Foi o próprio Schiaffino quem esclareceu: «Só fiz dois golos nesse jogo. O que é estranho é que a FIFA não tenha acertado com o resultado. Atribuíram-me quatro golos, o que não é certo, e também cinco, o que é ainda pior», frisou.

Desde então o recorde de cinco golos num jogo é de Oleg Salenko e ainda ninguém conseguiu marcar mais.


 
Este jogo selou o final da prova para as duas seleções. De regresso ao futebol de clubes, Salenko, que a par de Hristo Stoitchkov foi o melhor marcador da prova, trocou o Logroñés pelo Valencia, mas saiu após uma época. Ainda passou pela Escócia e pela Turquia, acabando por arrumar as chuteiras cedo.
 
Já a reforma de Roger Milla foi tudo menos precoce. Depois do mundial ainda passou clubes da Indonésia, encerrando definitivamente a carreira em 1997, aos 45 anos.