PLAY é um espaço semanal de partilha, sugestão e crítica. O futebol espelhado no cinema, na música, na literatura. Outros mundos, o mesmo ponto de partida. Ideias soltas, filmes e livros que foram perdendo a vez na fila de espera. PLAY.

SLOW MOTION:

«ROGER MILLA: LA LÉGENDE» - de Alain Fongue
Aos 38 anos, o que pode almejar um avançado? Jogar num escalão secundário? Entreter-se ao fim-de-semana numa partida de veteranos? Marcar quatro golos num Campeonato do Mundo?

Não há uma resposta correta e infalível. A não ser que estejamos a pensar em Roger Milla. Se o leitor tem mais de 30 anos e devora as histórias dos Mundiais, certamente terá esta personagem na cabeça, qual herói de uma qualquer narrativa cara ao tema do fantástico.

Sim, aos 38 Roger Milla não se contentava em calçar as chuteiras ao domingo e matar a ferrugem num pelado. Quase quarentão, o camaronês foi protagonista maior do Itália-90 e ainda teve pernas para, quatro anos mais tarde, fazer mais um golo num Campeonato do Mundo [aos 42!].

Lendário, mágico, malabarista camaronês, Roger Milla entrou-nos pela casa adentro há 24 anos. Para não voltar a sair, o abusador.

Nesse Mundial de Itália, Milla foi convocado pelo selecionador dos Leões Indomáveis contra todas as regras da lógica e da razoabilidade. Jogava, então, num pequeno clube da Ilha de Reunião e parecia já condenado ao anonimato de um final de carreira pouco mais do que simpático.

Eis, então, que o Presidente da República desse país africano impõe o nome de Milla. E lá foi o velhote, rodeado pelos protestos do povo e dos colegas de equipa. Começou discreto, dez minutos frente à Argentina, para logo depois saltar do banco e fazer dois golos à Roménia.

Não voltou a sair da equipa e guardou o melhor para os oitavos-de-final. Os Camarões eliminaram a Colômbia no prolongamento e Roger Milla teve a desfaçatez de humilhar El Loco Higuita.

Num dos mais célebres momentos da enciclopédia mundialista, Milla não se impressionou com o drible kamikaze de Higuita, roubou-lhe a bola e borrou-o de vergonha. Poucos se lembrarão do primeiro golo dele nesse jogo, mas foi um pedaço de ouro africano. Pode vê-lo num dos vídeos seguintes.

Falta ao Mundial do Brasil um futebolista assim. Meio artista, meio feiticeiro e a bailar como nenhum outro na bandeirola de canto. Este é o seu filme.

Roger Milla, ou Miller, como a televisão italiana insistia em chamá-lo.





PS: «24» - de Robert Cochran e Joel Surnow.
Perante a pobreza de oferta no cinema da época, um clássico no período estival, nada melhor do que reencontrar uma das mais complexas personagens de sempre numa série: Jack Bauer, o herói imperfeito de 24.

Quatro anos depois, Kiefer Sutherland volta a encarnar o antigo agente federal, agora desterrado em Londres e procurado pela Casa Branca. A caça ao homem é um vício. É desta que ele morre?




VIRAR A PÁGINA:

«O ESSENCIAL DOS MUNDIAIS (para ler em 90 minutos)».
Arrisco o elogio em causa própria para sublinhar a obrigatoriedade de ter este livro escrito pela redação do Maisfutebol. Para quem adora as histórias dos Campeonatos do Mundo e pormenores deliciosos pelos maiores artistas, nada melhor do que comprar (ou pedir emprestado) um exemplar destes. Vai acabar de sorriso nos lábios e vontade redobrada de ver os jogos da Copa do Brasil. 

O Nuno Madureira já explicou tudo no nosso programa na TVI24.



SOUNDCHECK:

«UN ESTATE ITALIANA» - Edoardo Bennato e Gianna Nannini.
Deixem-me desabafar: achei absolutamente miserável aquela espécie de música, interpretada por Jennifer Lopez e respetivos compinchas de ato falhado, na abertura do Mundial. Ou os meus tímpanos são de uma exigência anormal ou é de facto muito mau.

Há quanto tempo os Campeonatos do Mundo não têm um hino oficial que encante e fique no ouvido anos a fio? Há quanto tempo não há uma música como esta de 1990? Isto tocava e eu não deixava ninguém mexer na televisão.

É por isso que vem pela segunda vez ao PLAY.



PS: «Diffraction / Refraction» - You Can’t Win, Charlie Brown.
Estética aprumada, obcecada pelo detalhe, intimista por regra e luminosa em pedaços cirúrgicos e competentes. David Santos, ou Noiserv, faz parte desta super-banda de seis elementos, tal como João Gil, dos Diabo na Cruz.

O sexteto lisboeta editou o segundo álbum no início do ano e prima pela qualidade. A começar no nome da própria banda, uma escolha fantástica, e a eclodir nas opções musicais, de uma riqueza anormal no contexto da música nacional.

Este Be my world é uma grande música, mas há muito mais no segundo disco da banda. After December e Fall for You justificam todas as loas.



«PLAY» é um espaço de opinião/sugestão do jornalista Pedro Jorge da Cunha. Pode indicar-lhe outros filmes, músicas, livros e/ou peças de teatro através do e-mail pcunha@mediacapital.pt. Siga-o no Twitter.