Há coisas que precisam de tempo para ganhar o valor que merecem.

Era agora que falava do Vinho do Porto. Mas prefiro não o fazer. Estou a pensar que ainda vou conduzir a seguir.

Mas há realmente coisas que só com a idade conseguimos valorizar.

A expressão «tu estás na mesma, pá», por exemplo.

Aos catorze anos atormentavam-me profundamente. Pensar que podia chegar aos vinte e continuar a ser perseguido pelo funcionário do salão de jogos, era por aquela altura uma ideia assustadora.

Agora que já passei os trinta, soa-me a elogio. Pode não ser, admito, mas até prova em contrário não acredito que não o seja.

Acho que já atingi aquele ponto de maturação em que estou pronto a ser servido. Se me mantiver na mesma, estou bem, portanto.

No fundo é a lei da vida. Um tipo nasce, cresce, atinge o ponto de rebuçado e a partir daí inicia o plano descendente.

Nesse longo período da curva de regresso, enquanto ouvir «tu estás na mesma, pá» está bem. Os corantes e conservantes mantêm-no bebível.

Se o mundo fosse um sítio justo os dias passavam e nós estávamos na mesma, pá.

Mas o mundo é um país latino, perdeu o sentido de justiça. Por isso há que valorizar enquanto nos mantivermos na mesma.

Eu, pelo menos, valorizo muito esta linha de continuidade.

Em mim, nas tortas de Azeitão ou nas pernas da Carla Bruni: há coisas que não deviam mudar nunca.

Mas valorizo-a também em Raul Meireles, por razões diferentes. Estava a vê-lo jogar no domingo, com o Estrela, e a pensar «o gajo está na mesma há anos, pá».

Se calhar por isso é que ainda não recebeu o reconhecimento que merece. É sempre tão competente que até passa despercebido.

Raul Meireles defende, ataca, temporiza, estica, faz compensações, recupera bolas, distribui, preenche espaços, bate livres. Tudo bem.

Quando a equipa ameaça partir, é ele que segura as pontas e enlaça as partes. É ele que garante a harmonia colectiva.

É inteligente e altruísta. Conhece como ninguém os processos da equipa, percebe rapidamente o que é preciso e executa sempre bem.

Não é de hoje, aliás. Há três anos que está na mesma. Quando se diz que Lucho, Lisandro ou Bruno Alves são imprescindíveis, parece-me uma injustiça.

Raul Meireles é tão imprescindível quanto qualquer um deles. Há três anos que é assim, repete-se.

Mas o mundo é um país latino. Sobretudo em Portugal. Resta pensar que há coisas que precisam de tempo para ganhar o valor que merecem.

Para já esse é o maior elogio que se lhe pode fazer. «Tu estás na mesma, pá!».

«Box-to-box» é um espaço de opinião da autoria de Sérgio Pereira, jornalista do Maisfutebol, que escreve aqui todas as semanas