Pelé, Tostão e Jairzinho no ataque; Gerson, Clodoaldo e Rivelino ligeiramente atrás deles; Carlos Alberto, Brito, Everaldo e Piazza logo diante do guarda-redes Felix. Da frente para a retaguarda, a começar pelo Rei e a acabar no elo mais fraco, senhoras e senhores, eis o maravilhoso Brasil do Mundial de 1970. 70, como a idade que agora atinge Pelé.

Lá no ataque, subtil e sagaz, estava aquele que havia de ficar conhecido como o Pelé branco. Tostão, sempre elegante, sempre recatado. Apontado por muitos como o melhor parceiro de sempre do Rei, rejeita em absoluto a ideia ao Maisfutebol. Por um simples motivo:

«Ao lado de Pelé todos parecem ser um excelente parceiro. Era eu, o Rivelino, o Jairzinho, como tinham sido antes o Garrincha, o Djalma Santos e o Bellini. O melhor do mundo faz com que tudo pareça mais simples», diz Tostão, enleado no prazer das memórias. «O nosso futebol era fantástico e o Pelé era a origem de tudo. Passe, toque, movimentação, quase sempre pela relva. Foram instantes únicos.»

Três ao telefone com o Presidente da República

Tostão teve um grave problema de saúde - quase ficou cego -, tornou-se médico e deixou de conviver regularmente com Pelé. Os 70 anos do Rei não lhe passam ao lado, porém, e há sempre uma história na ponta da língua.

«Eu era muito recatado e o Pelé chateava-me muito por causa disso. Estava sempre a puxar-me para a brincadeira. Mas eu preferia o silêncio do meu quarto. Só na noite em que fomos campeões do mundo fiquei até mais tarde com a equipa», recorda Tostão.

«Avisaram-nos que o Presidente da República [Emílio Medici] ia telefonar a dar-nos os parabéns. Eu, o Pelé e o Carlos Alberto fomos os escolhidos para falar com ele. Mal desliguei o telefone fugi da festança para a tranquilidade, até o Pelé me vir acordar. Era sempre assim», ri a antiga estrela, agora comentador desportivo no Brasil.

«Baixinho, eu dou uma bola e recebo uma bala»

No Mundial de 66 Pelé sucumbiu à qualidade dos magriços e à marcação de Vicente Lucas e Morais. António Simões era uma das principais figuras ao serviço da dupla Otto Glória/Manuel da Luz Afonso e vingou-se nessa prova de uma humilhação com quatro anos.

«No Benfica-Santos de 62, para a Taça Intercontinental, o Pelé chateou-se e foi uma chatice. Teve uma actuação fabulosa, marcou três golos e confirmou que era, de facto, o Rei, o melhor do mundo. Antes tinha havido o Di Stéfano, depois houve o Maradona, um punhado de príncipes e agora há o Messi», vinca Simões que, já na década de 70, haveria de defrontar Pelé nos relvados sintéticos do soccer.

«Eu jogava com o Eusébio nos Boston Minutemen e recebemos o Cosmos, onde estava o Pelé. Demos 5-0. A meio do jogo falei com ele: Pelé, com esta equipa você está lixado. Eles não jogam nada. Respondeu-me logo, de braços caídos. Baixinho, eu estou a dar uma bola e eles devolvem uma bala. Não dá para jogar

Nesse período, António Simões teve a oportunidade de conhecer melhor o carácter de um dos seus principais adversários. «Defino o Pelé com objectividade. Ele é como um cirurgião rico, que opera e cobra imenso dinheiro aos pacientes ricos, mas que trata gratuitamente dos que não têm dinheiro.»

Portugal-Brasil no Mundial-66: