Texto da autoria do jornalista Paulo Pedrosa, publicado no Maisfutebol por ocasião dos 40 anos de José Mourinho

O pai chama-lhe Zé, a mãe Mário. Os amigos tratam-no por Zé Mário. Nos jornais, o treinador do F.C. Porto é José Mourinho. Primeiro e último nome de uma personalidade forte que, segundo os familiares, nasceu e moldou-se junto da relva, com uma bola de futebol por perto. Uma vida vivida rápida e intensamente orientada pela paixão de um dia ser treinador principal.

«Com 15/16 anos ele dizia-me o que queria ser quando fosse grande: treinador de futebol», recorda ao Maisfutebol Félix Mourinho, pai do técnico do F.C. Porto, salientando que já nesta altura o adolescente Zé Mário desenvolvia um trabalho de campo para ajudá-lo: «De repente começou a analisar as equipas contra quem nós íamos jogar. Fazia relatórios do que via e auxiliava-me muito», refere. E dá um exemplo: «Tive um jogo de grande importância quando estava no União da Madeira. Íamos à Amadora e tínhamos de, pelo menos, empatar para que pudéssemos estar na liguilha de acesso à I Divisão. Durante uma semana, ele seguiu os treinos do Estrela e aquilo que me disse, os conselhos que me deu, serviram para irmos lá empatar a zero. Ele disse-me a forma como o adversário jogava, como treinava. Eu ficava satisfeito com o trabalho dele e como compensação dava-lhe dinheiro.»

Cuidado com o Português

Nos relatórios, a mãe, Maria Júlia Mourinho, professora aposentada, conferia a gramática e a ortografia. «Ia meter a colherada para ver a parte do português. Eram relatórios fora do normal para a idade dele. Aos quinze anos já fazia isso», confirma.

Mas a história de um pequeno menino com grandes ambições surge em tenra idade. José Mourinho cresceu no seio de uma família muito ligada ao Vitória de Setúbal. «O Zé viveu muito do futebol», conta Maria Júlia. «Aprendeu a andar no estádio do Vitória e chegou a interromper muitas vezes o treino do Setúbal porque queria correr para o relvado», relata, acrescentando Félix Mourinho que o pequeno Zé tinha um fascínio especial por uma prenda: «A bola para ele era tudo. No Natal ou quando fazia anos, se não lhe déssemos uma bola parece que não tinha prendas. Pedia outras coisas, mas «a prenda» era a bola. Tinha de estar tudo ligado a ela.»

Um cão chamado Gullit

A mãe de José Mourinho tentava refrear os ânimos futebolísticos do rapaz, ávido por seguir a carreira do pai. «Quando tinha 10/12 anos, o pai perguntava-lhe: ¿Zé, sabes quem é o fulano tal que joga naquela equipa?¿ Ele sabia tudo e eu dizia-lhe: ¿Rapaz, se tu soubesses a Biologia como sabes isso era uma maravilha!¿», lembra Maria Júlia, acrescentando uma prática habitual em casa: «Ele baptizava os cães com o nome dos jogadores estrangeiros. Uma das paixões de casa era o Gullit.»

O pai do actual treinador do F.C. Porto também preferia que Zé Mário traçasse um caminho paralelo ao futebol, de forma a poder ganhar a vida. Jogador de futebol, só se conseguisse ser um fora-de-série. «Eu e a mãe não alimentámos muito essa ideia porque só o queríamos jogador se fosse suficientemente bom para ganhar a vida. Caso contrário era preferível que se dedicasse aos estudos, tirasse um curso e jogasse nas horas vagas», refere Félix, salientando, no entanto, os atributos do pequeno Zé: «Ele tinha qualidades. Não tinha era qualidades suficientes para viver só do futebol. Pedimos-lhe que tirasse primeiro o curso.»

José Mourinho chegou a jogar nos juniores do Belenenses. Já sénior vestiu a camisola do Rio Ave. Mais tarde voltou ao Restelo, depois ao Sesimbra e acabou no Comércio e Indústria. Já na altura leccionava Educação Física e começava a preparar-se para ser treinador de futebol.