Figo. Sempre Figo. Também sob o ponto de vista de um psicólogo, ele é o melhor. Jorge Silvério vai mais longe e atribui igual importância à parte psicológica, comparada com a componente física, para explicar a qualidade do jogador do Real Madrid. Se destacar um bom exemplo parece fácil, Jorge Silvério prefere não especificar casos complicados. Mas explica que é «muito diferente a pressão de um futebolista, quando comparada com a de um desportista de outra modalidade».
MAISFUTEBOL -- Qual é, para si, o melhor exemplo de um jogador com grande força psicológica?
Jorge Silvério -- Talvez o Figo... É, sem dúvida, um atleta completo, com uma estrutura muito sólida. Se fosse treinador, queria, certamente, tê-lo na minha equipa. Grande parte do seu sucesso tem a ver com força psicológica. Não explica tudo, claro, mas ajuda muito.
MF -- No Portugal-Holanda, nas Antas, a grande penalidade que deu o empate nos últimos minutos tinha que ser marcada por ele...
JS -- Acho que esse momento revela muito da força psicológica de um jogador. Ele marcou a grande penalidade com naturalidade, porque era o jogador que mais confianla mostrava ter num momento como aqueles. Basta ver toda a história do Figo para perceber isso. O Cruijff dizia uma vez que só quer trabalhar com jogadores fortes: física e psicologicamente. E o Figo é um desses jogadores. Sabemos que a probabilidade de ele falhar é menor.
MF -- E no plano oposto, que jogador destaca como sendo fraco do ponto de vista psicológico?
JS - É complicado estar a falar de alguém. Diplomaticamente, seria problemático estar a falar de nomes.
MF -- É muito diferente trabalhar com futebolistas e com atletas de outras modalidades?
JS - É, é diferente em vários níveis. Primeiro, porque uma coisa é trabalhar com modalidades individuais e outra bem diferente é trabalhar com modalidades colectivas. Depois, o futebol diferencia-se de todas as outras modalidades, porque há uma grande distância do ponto de vista dos interesses, da pressão, do dinheiro... A pressão dos dirigentes, a pressão da comunicação social, a pressão dos adeptos. A pressão de um futebolista é completamente diferente da pressão que os outros desportistas sofrem.
MF -- Qual é a pressão que mais afecta um futebolista? A dos adeptos, a dos media, a dos dirigentes?
JS - A maior pressão é a dos próprios jogadores. O principal mecanismo de pressão temos somos nós mesmos. Aquilo que nós dizemos a nós mesmos. É o que chamamos, normalmente, de discurso interno. Um exemplo: uma equipa vai jogar a um sítio onde já não ganha há dez anos. A comunicação social, normalmente, fala nisso. Tudo bem. A questão está em saber como é que o jogador vai reagir a isso. Pode pensar: 'não ganhamos lá há dez anos, é mesmo desta que os gajos não vão ter hipóteses'; ou, por outro lado, pensar: 'realmente, no ano passado nem jogámos nada lá... Vai ser impossível'. São duas maneiras opostas de se reagir ao mesmo problema. Deve é ser trabalhado o lado que acha que as coisas vão correr bem.
Leia ainda:
- «Os factores mentais podem fazer a diferença no futebol», diz psicólogo do desporto
- A força psicológica da selecção nacional
- Jorge Silvério: «Nova geração tem outra mentalidade»
- «Não devemos tratar só dos casos-limite», diz Jorge Silvério
- «Um treinador só tem a ganhar com um psicólogo na equipa», garante Jorge Silvério
- Bruxos e rituais: «Explicações para os nossos próprios falhanços»
- «Como ganhar usando a cabeça»: as frases de Oliveira e Rui Costa
- «Como ganhar usando a cabeça» -- pré-publicação no Maisfutebol