PLAY é um espaço semanal de partilha, sugestão e crítica. O futebol espelhado no cinema, na música, na literatura. Outros mundos, o mesmo ponto de partida. Ideias soltas, filmes e livros que foram perdendo a vez na fila de espera. PLAY.

SLOW MOTION:

«THE REFEREES» - de Yves Hinant, Eric Cardot e Delphine Lehericey
Os árbitros. Todos adoram odiá-los. Os bad guys, os senhores do jogo que estão ali propositadamente a prejudicar a nossa equipa. Os ceguinhos que apitam sempre contra nós e deixam passar tudo aos outros.

Será mesmo assim? Seremos capazes de olhar para eles, homens como nós, com justiça e rigor?

O que há por trás de cada árbitro? O que os leva a tomar determinada decisão? De que forma interagem com os jogadores durante uma partida? O que pretendem, afinal, do futebol?

O que leva um homem que goste de futebol a ser árbitro? Se gostamos de futebol, queremos - acho eu - é marcar golos e fazer jogadas de outro mundo. Agora, apitar? Porquê? O que os transporta para trás do apito e os coloca no olho do furacão?

Este documentário oferece respostas convincentes a todas as questões que levanto. No centro do jogo, sim, mas longe da adulação oferecida aos que o rodeiam.

O que têm de suportar, como se relacionam entre si, uma viagem interessantíssima ao mundo de Howard Webb, Massimo Busacca, Roberto Rosetti e outros árbitros durante o Euro2008.

Há momentos fatásticos. Escolho dois. Busacca recebe uma comunicação do quarto árbitro. «Massimo, está a aproximar-se uma tempestade». O suíço responde. «O quê? Quero lá saber, cala-te. Concentra-te no jogo, não me fales do que não interessa».

Mais um. Howard Webb comparado a Adolf Hitler pelo primeiro-ministro polaco, depois de ter cometido um grave erro. Os jornalistas levam a imagem de Webb com o bigode à ditador para a conferência de imprensa. E o inglês aguenta isto tudo.

Não sei se o leitor é do tipo tolerante ou inflexível. Tenho é a certeza de que depois de ver este documentário vai começar a olhar de outra forma para os árbitros. Mesmo que ele se chame Bruno Paixão e assinale um penálti contra a sua equipa no último minuto.

Bem, isso talvez já seja pedir demasiado.     
  


PS: «Fury» - de David Ayer.
Um tanque de guerra, cinco homens, ação e entretenimento de qualidade garantidos. Um belo filme. Brad Pitt lidera o mini pelotão de soldados dos Aliados. O argumento coloca-nos no final da II Grande Guerra e dentro das linhas de tropas do hediondo III Reich. Depois... tudo acontece e estes bravos, cinco deles, são capazes de ceifar centenas de inimigos, sempre dentro da carapaça a que chamam Fury.    

O realizador é David Ayer (End of Watch - Fim de Turno). Shia LaBeouf, Logan Lerman, Michael Peña e Jon Bernthal completam o leque de protagonistas.



SOUNDCHECK:

«BEAUTIFUL GAME» - dos New Model Army.

Por trás desta música está, apenas e só, The Ball. A expressão tem duplo sentido. Refere-se à bola, a nossa companheira de tantos sonhos e tantos momentos, e a uma organização não governamental, cujo trabalho incide sobre indivíduos desfavorecidos, um pouco por todo o mundo. 

Em vésperas do Campeonato do Mundo, e apostando na inclusão de muitos brasileiros que, à partida, estariam afastados da festa do futebol, a organização convidou uma banda inglesa para musicar a viagem entre Inglaterra (e os Jogos Olímpicos de Londres) e o Brasil.

Os New Model Army, veteranos do punk rock, formados em Bradford, aceitaram o desafio e arrancaram uma composição muito decente. Vale a pena ouvir e pensar. O futebol é muito mais do que uma bola.



PS: «Tomorrow’s Modern Boxes» - de Thom Yorke.
Conhecemo-nos em novembro de 1993. Quase por acaso. Fui ao encontro dos James, outros velhos camaradas, e ele apareceu sem avisar. Cabelo espetado, loiro quase branco, um olho semicerrado e o outro fixo num ponto invisível.

Coliseu do Porto à pinha. Ouvi Creep, Thinking About You, Anyone Can Play Guitar, Stop Whispering e jurei-lhe fidelidade eterna. A ele e aos compinchas. Phil, Colin, Jonny e Ed, os muchachos de Sir Thom Yorke.

Acordei no dia a seguir e fui a corer à Tubitek. Comprei o cd dos rapazes de Oxford e ouvi-o ad nauseam. Até à exaustão. Eu e os Radiohead selámos logo ali um pacto de cumplicidade, o nosso Tratado: eles fazem música, eu compro-a e ouço.

O acordo tem corrido bem. É para continuar.

Thom Yorke, o génio dos génios, lançou agora o segundo álbum a solo. Oito faixas para degustar, acorde a acorde, nota a nota.

Os James? Ah, também gostei. Mas não é a mesma coisa.          



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«LA SOLEDAD DEL PORTERO» - de Sandy Mentor
Uma ode à atividade/condição/função de guarda-redes. O autor é um jornalista que, nos tempos áureos dos relvados (e pelados), chegou à baliza de um clube espanhol da terceira divisão. Daí, Sandy parte para a comparação com nomes consagrados (Cañizares, Ricardo, Casillas) e arranca um livro de estreia repleto de histórias deliciosas.

Eu, também futebolista amador, junto-me a esta causa de ser guarda-redes. Nunca esquecerei a dureza dos treinos no campo de terra batida, muitas vezes enlameado. Nós, os jogadores de campo, a fazer uma peladinha (ainda não se falava em transições, posse de bola, basculação) e eles, os keepers, a atirarem-se de um lado para o outro, ensopados, desesperados e apaixonados pela arte de bem defender. 
«PLAY» é um espaço de opinião/sugestão do jornalista Pedro Jorge da Cunha. Pode indicar-lhe outros filmes, músicas e/ou livros através do e-mail pcunha@mediacapital.pt. Siga-o no Twitter.