Sete anos depois de a Liga ter começado a organizar os campeonatos, o director-executivo do organismo não tem dúvidas em afirmar que «o futebol português melhorou a olhos vistos». Guilherme de Aguiar reconhece que nem tudo está arrumado, mas já se pode falar de uma «separação clara» entre futebol profissional, não-profissional e formação.

Maisfutebol -- A Liga organiza os campeonatos profissionais em Portugal há sete anos. Já dá para fazer um balanço?

José Guilherme de Aguiar -- Não sei se já dará. O que sei é que houve um caminho que foi percorrido e que tem contribuído para a melhoria do futebol português. Mesmo antes de começar a organizar os campeonatos profissionais, em 1995/96, ainda sob o nome «encapotado» de Organismo Autónomo, a Liga tinha criado alguns mecanismos que se vinham tornando notados, era notório que algo de novo e diferente se passava. Criámos os dois primeiros tribunais de resolução de litígios: a Comissão Arbitral da Liga, em 1989, e mais tarde, nos primeiros anos da década de 90, a Comissão Arbitral Paritária, que é diferente, uma vez que se integra numa Convenção Colectiva de Trabalho, que consagra a igualdade de representação entre trabalhadores e patrões. Agora está tanto em voga a resolução simplificada de conflitos, ora fomos nós quem iniciou esse caminho, reconhecido aliás pelo ministro da Justiça de então, que assinou despacho autorizando a criação desses tribunais.

MF -- No início da década de 90, o artigo 24.º da Lei de Bases do Sistema Desportivo consagrava a existência de um organismo que gerisse o futebol profissional. Mas a transição da Federação para a Liga não foi imediata...

JGA - Sim, teve que haver uma alteração no decreto-lei 143/93 do Regime Jurídico das Federações Desportivas, que foi subsequente a essa alteração constitucional, para que se reconhecesse que o organismo autónomo de que fala a Lei de Bases do Sistema Desportivo era, efectivamente, a Liga de clubes. Não foi para isso que ela foi criada, em 1979, ela surgiu de um problema de natureza laboral e sindical, mas a partir do momento em que surge como entidade profissional torna-se inevitável como organizadora dos campeonatos profissionais.

MF -- Houve, no início, alguma resistência das associações distritais, que na altura detinham um poder que estavam na iminência de perder. Na sua opinião, a separação de poderes e funções entre Liga, Federação e associações já está devidamente arrumada no futebol português?

JGA --Não sei se está totalmente arrumada e compartimentada, mas julgo que é evidente o trabalho que fizemos. Tentámos introduzir uma nova forma de resolver os problemas, mais simples, mais eficaz e em benefício dos clubes. Não vou dizer que esta fórmula é a melhor, mas pelo menos acho que o futebol português está mais arrumado do que estava nessa altura. E acho que ninguém põe em causa que hoje os clubes têm mais e melhores condições. Antes dessa mudança, a associação que detinha mais clubes chamava a si mais votos e assim obtinha maior influência. Daí a resistência que fala, uma vez que a Liga funciona numa lógica totalmente diversa, em que todos têm igual número de votos. A Liga assume-se, assim, como um organismo isento e que trata todos os clubes por igual. Damos o mesmo relevo aos clubes do norte, do centro, do sul e das ilhas e o que pretendemos é o bem do futebol português no seu todo.

MF -- É verdade que todos têm o mesmo voto, mas agora pagam verbas diferentes para o orçamento...

JGA - O que está em causa é um princípio de solidariedade. Nada tem a ver com os votos. São os próprios grandes que deverão partilhar essa ideia. Interessa a todos a viabilidade da competição. Será melhor para todos que a competição seja bem disputada. Para isso necessita de ter condições. Quanto maior foi o número de clubes que tiverem aptidões e capacidades para discutir os primeiros lugares, os campeonatos tornam-se mais interessante e atraem mais público e mais receitas. Quanto mais equilibrada for a competição, mais rentável ela é. Recordo que nos primeiros anos de campeonato organizado pela Liga, uma equipa distanciou-se de todas as outras muito cedo, tirando emotividade à prova. Nos últimos dois anos, o título discutiu-se quase até ao último minuto e estou certo de que isso vai continuar a acontecer. Só é bom para o futebol português que tal aconteça. Olhemos para o caso espanhol, em que várias equipas estão separadas por poucos pontos, até mesmo por um só ponto.

MF -- E os grandes vão mesmo aceitar pagar mais que os outros?

JGA -- Têm que o querer, porque são os primeiros a desejar uma competição emotiva. O equilíbrio que tem imperado no campeonato português é um bom sinal. Aumenta o número de espectadores, aumenta a publicidade, aumentam as receitas...

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